Diálogos
PCosta - Começando pelo texto da Alzira, continuo a dizer que lhe reconheço, para além da qualidade do português, argumentos poderosos na defesa do ensino da literatura, da exigência, da qualidade, do rigor, aspectos que no entender dela, e de tantos nossos colegas, andam um pouco afastados do ensino.
Este ´abaixamento da fasquia`, como todos sabemos, deve-se à massificação do ensino (eu prefiro chamar-lhe democratização), pois houve a entrada obrigatória para o sistema educativo de todas as pessoas com idade escolar, fossem elas amarelas, azuis, deficientes, disléxicas, coxas, do campo, gordas... e isso parece que atrapalha. Acredites, ou não, a sociedade no geral, no seu conjunto e em termos de médio e longo prazo, beneficia mais com um sistema destes, do que com um sistema em que os principais valores sejam a rigidez, a selecção, ... as tais qualidades utilizadas demagógicamente: rigor, exigência, qualidade, etc. Bem, mas o que me interessa mais no meio disto tudo é que não vejo outra forma, fosse eu iluminado, para defender a nossa dama: a literatura, sem que com isso, não sejamos corporativistas. Dito de forma ainda mais simples, há que lutar contra a Arte, contra a Educação Física, contra a Matemática, contra, contra, contra, porque o espaço é curto, as horas são poucas...
(...)
Soledade Santos – (...) alguns dos colegas com quem experimento maior afinidade são justamente da Matemática. Que afinal também é uma linguagem. E o desenvolvimento da competência (esta palavra faz-me ranger os dentes) de leitura não é exclusivo do Português. Costumo dizer aos meus alunos que a vida é um texto. E seguramente a Literatura ajuda a decifrá-lo. Mas como andamos todos a brincar às escolas do Paraíso e a tapar o sol com a peneira... Desabafemos, se isso nos desoprime um pouco. E agora sou eu quem diz: coragem! (...)
No texto da Alzira Seixo não estava em causa a proeminência de uma disciplina face às outras, não se tratava de guerrinhas corporativistas entre grupos disciplinares. (...) E tb na Educação Física se lê/aprende a ler. Estava em causa, sim, uma dada concepção de escola (a que pastoreia crianças, os Bons Selvagens - alguém nas ESE(s) e no Min-Edu está a precisar de ler o "Senhor das Moscas"- e, no que concerne à disciplina de Português, os novos programas, centrados na (obcecados pela?) perspectiva comunicacional e (vou ranger os dentes outra vez) transaccional, encarando a literatura como "componente decorativa e obsoleta". Segunda coisa: tens razão quando referes a massificação do ensino e os problemas que isso trouxe à escola. Mas a solução não é entreter crianças, inventando simulacros de sucesso. É respeitá-las, porque elas merecem todo o nosso respeito, é "puxá-las para cima", e não descer ao nível mais raso; é não ter medo de ser politicamente incorrecto e assumir, de uma vez por todas, que a escola dita "inclusiva" é na verdade profundamente injusta, exclusiva e selectiva (a selecção fá-la-á a vida, mais tarde, e da forma mais cruel). Isto porque enfiar crianças "amarelas, azuis, deficientes, disléxicas, coxas, do campo, gordas" nas mesmas (e cada vez maiores) turmas, e fingir que é possível, nessas condições, um ensino diferenciado e uma leccionação eficaz, é condená-las, à partida, ao insucesso. É enganá-las. Tem de haver outro caminho: começar por admitir a diferença; e permitir a cada aluno chegar tão longe quanto puder, em lugar de nivelar todos pelo mais baixo denominador comum. Pastorear crianças e jovens, promover uma cultura da impunidade e da mediocridade, infantilizá-los, mantê-los na ignorância e depois largá-los, impreparados, num mundo cada vez mais hostil, parece-me criminoso. Dói-me, revolta-me! Muito mais que as provocações e humilhações da Sra Ministra. E é isto que eu penso.
Este ´abaixamento da fasquia`, como todos sabemos, deve-se à massificação do ensino (eu prefiro chamar-lhe democratização), pois houve a entrada obrigatória para o sistema educativo de todas as pessoas com idade escolar, fossem elas amarelas, azuis, deficientes, disléxicas, coxas, do campo, gordas... e isso parece que atrapalha. Acredites, ou não, a sociedade no geral, no seu conjunto e em termos de médio e longo prazo, beneficia mais com um sistema destes, do que com um sistema em que os principais valores sejam a rigidez, a selecção, ... as tais qualidades utilizadas demagógicamente: rigor, exigência, qualidade, etc. Bem, mas o que me interessa mais no meio disto tudo é que não vejo outra forma, fosse eu iluminado, para defender a nossa dama: a literatura, sem que com isso, não sejamos corporativistas. Dito de forma ainda mais simples, há que lutar contra a Arte, contra a Educação Física, contra a Matemática, contra, contra, contra, porque o espaço é curto, as horas são poucas...
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Soledade Santos – (...) alguns dos colegas com quem experimento maior afinidade são justamente da Matemática. Que afinal também é uma linguagem. E o desenvolvimento da competência (esta palavra faz-me ranger os dentes) de leitura não é exclusivo do Português. Costumo dizer aos meus alunos que a vida é um texto. E seguramente a Literatura ajuda a decifrá-lo. Mas como andamos todos a brincar às escolas do Paraíso e a tapar o sol com a peneira... Desabafemos, se isso nos desoprime um pouco. E agora sou eu quem diz: coragem! (...)
No texto da Alzira Seixo não estava em causa a proeminência de uma disciplina face às outras, não se tratava de guerrinhas corporativistas entre grupos disciplinares. (...) E tb na Educação Física se lê/aprende a ler. Estava em causa, sim, uma dada concepção de escola (a que pastoreia crianças, os Bons Selvagens - alguém nas ESE(s) e no Min-Edu está a precisar de ler o "Senhor das Moscas"- e, no que concerne à disciplina de Português, os novos programas, centrados na (obcecados pela?) perspectiva comunicacional e (vou ranger os dentes outra vez) transaccional, encarando a literatura como "componente decorativa e obsoleta". Segunda coisa: tens razão quando referes a massificação do ensino e os problemas que isso trouxe à escola. Mas a solução não é entreter crianças, inventando simulacros de sucesso. É respeitá-las, porque elas merecem todo o nosso respeito, é "puxá-las para cima", e não descer ao nível mais raso; é não ter medo de ser politicamente incorrecto e assumir, de uma vez por todas, que a escola dita "inclusiva" é na verdade profundamente injusta, exclusiva e selectiva (a selecção fá-la-á a vida, mais tarde, e da forma mais cruel). Isto porque enfiar crianças "amarelas, azuis, deficientes, disléxicas, coxas, do campo, gordas" nas mesmas (e cada vez maiores) turmas, e fingir que é possível, nessas condições, um ensino diferenciado e uma leccionação eficaz, é condená-las, à partida, ao insucesso. É enganá-las. Tem de haver outro caminho: começar por admitir a diferença; e permitir a cada aluno chegar tão longe quanto puder, em lugar de nivelar todos pelo mais baixo denominador comum. Pastorear crianças e jovens, promover uma cultura da impunidade e da mediocridade, infantilizá-los, mantê-los na ignorância e depois largá-los, impreparados, num mundo cada vez mais hostil, parece-me criminoso. Dói-me, revolta-me! Muito mais que as provocações e humilhações da Sra Ministra. E é isto que eu penso.
Eu acrescentaria: que a escola está massificada (e muito bem) é claro. O que «antigamente» se fazia na escola não serve para hoje - porque os alunos são outros, a educação que (não) trazem também. Mas o que hoje se faz, definitivamente, também não serve. É preciso arranjar alternativas. Se os pais não educam, se a escola é onde eles têm de passar a maior parte dos seus dias, então é necessário dotá-la de instrumentos eficazes e não inundá-la de leis avulsas de quem parece nada perceber do que está a fazer... (planos de recuperação para alunos que respondem como este?)
É preciso TEMPO para tudo. Os horários sobrecarregados de componente curricular em sala de aula são claramente exagerados.... (falo do que vejo cá em casa – para se manterem numa fasquia de classificações elevada, as minhas filhas não têm quase tempo de apenas vegetar).
Mas há os que não precisam de Estudo Acompanhado, porque têm quem os acompanhe em casa. Há os a quem a Formação Cívica é dada em casa. Então porque perdem essas horas em «actividades» na escola?
Porque não atribuir a cada turma 2 directores/tutores, um de cada área (letras, ciências), com, por exemplo, metade do seu horário lectivo para atender às solicitações que a mesma peça. Se o que falta às crianças é acompanhamento, orientação, educação, então que se dê aos DTs espaço para «falar» com eles, para os orientar (tarefa de substituição de pais sem tempo ou sem formação). Em vez de estarem com 25 (na confusão), estariam apenas os que necessitassem, os que os pais solicitassem, e, fundamental, com tempo para atender individualmente a cada um. Como se organizaria? Caberia às estruturas pedagógicas pensá-lo (sala destinada à recepção de alunos problemáticos, sala(s) de estudo....) Os outros, que não precisam de acompanhamento e se «estragam» com as confusões a que se vão gradualmente habituando, esses poderiam frequentar os clubes ou as outras actividades organizadas na escola.
Não custaria muito ao erário público e possibilitaria aos DTs realmente «ouvirem» e «educarem» os seus alunos... Que se deixe as aulas, para instrução, que tão necessária é.
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