terça-feira, 25 de julho de 2006

VOU ALI...

(sem net, sem pasta, sem manuais, sem TLEBS, sem lápis nem canetas e, finalmente, sem CÉREBRO!)


...e já venho.
Boas férias a todos!

Limpezas

Depois do descalabro no Parlamento, eis que começa a surgir a «limpeza» jornalística.
E, infelizmente, continua a iluminada perspectiva do costume... dos que observam à noite, sem luz.

sábado, 22 de julho de 2006

Ilegalidades II

Exames do 12º ano podem ser impugnados

Os exames nacionais do 12º ano poderão ser impugnados pelos alunos do ensino secundário devido à excepção criada para alguns estudantes nas provas de Química e Física, referem especialistas em Direito em declarações ao semanário Expresso.
De acordo com Guerra Tavares, especialista em Direito Administrativo, o despacho do Ministério da Educação que permite a situação de excepção para as referidas provas pode ser «impugnado judicialmente» uma vez que é ilegal.

A mesma posição foi sustentada, em declarações ao Expresso, por outros especialistas em Direito, como o antigo bastonário da Ordem dos Advogados, José Miguel Júdice, Esteves de Oliveira e Fátima Anjos.

Para Júdice, o despacho do secretário de Estado Walter Lemos viola a Constituição nos princípios de «igualdade, imparcialidade e equidade».

Esteves de Oliveira considera que o despacho despacho «perverte gravemente o intuito igualitário», enquanto Fátima Anjos classifica a decisão de «manifestamente ilegal, pelo que deverá ser revogada».


Diário Digital 22-07-2006

Pessoas

por São José Almeida

(….)

2. A ministra da Educação é uma esperta e os portugueses são todos burros, em particular os professores, os alunos e os pais destes. Não há problema nenhum com os exames de 11º e 12º ano. É normalíssimo os alunos desatarem a chumbar, de repente, numa disciplina. É normalíssimo fazer exames só sobre dez por cento da matéria (como aconteceu em História). É normalíssimo os alunos baixarem abruptamente médias. É normalíssimo repetir exames a umas disciplinas e não a outras com base em critérios aleatórios e do tipo "eu acho que"... É normalíssimo pôr em risco o futuro dos actuais alunos e comprometer a sua entrada na universidade. É normalíssimo o Ministério da Educação enganar-se nos dados que disponibiliza ao longo de oito meses na Internet e que, por estarem errados adulteraram uma cadeia de decisões, opções e análises quer do próprio ministério, quer dos alunos, quer da sociedade em geral. É normalíssimo o ministério emitir directivas com base em leis que ainda estão em discussão pública e ninguém sabe se algum dia serão aprovadas pelo Parlamento e com que conteúdos. É normalíssimo a ministra da Educação achar que pode contratar professores escola a escola sem cobertura legal. É normalíssimo a ministra da Educação achar que pode alterar por decreto governamental leis da Assembleia da República em matérias da competência exclusiva da Assembleia da República. Tudo isto é normalíssimo e quem questiona ou é um professor calão, como o são todos os professores, ou é um aluno vigarista, a querer arranjar forma de ter boa nota sem ter estudado, ou é uma mãe ou um pai oportunistas, desejosos de ver a sua menina ou menino favorecidos e metidos na universidade. Tudo o que se passa com a actual ministra da Educação é normalíssimo, portanto. E não há nenhum erro, nem nenhum problema com os exames deste ano, como a própria ministra fez questão de explicar, no Parlamento, aos outros burros desta história, os deputados, que insistem em que sejam tiradas as devidas ilações políticas do imbróglio dos exames.
Num Estado de direito democrático com uma sociedade civil autónoma e madura, o que seria normal, era os lesados, as associações de pais, as associações de alunos e as associações de professores avançarem com acções em tribunal, contra o Estado, por discriminação e por coacção psicológica sobre os alunos. Porque é isso que está em causa. Por um lado, os alunos foram tratados de forma desigual, o que é antidemocrático e inconstitucional. Por outro lado, o clima de pressão psicológica que afecta, actualmente, os alunos, para mais num momento decisivo para o seu futuro, como é o dos exames que determinam as médias de acesso à universidade, é um perfeito caso de coacção e intimidação psicológica.
Resta ver se alguém tem consciência cívica e determinação para o fazer, num país em que a falta de pudor e de respeito pelas pessoas chega ao ponto de a ministra da Educação se manter em funções, no alto da sua arrogância e colada à cadeira, como araldite.


Público de 22.07.06

sexta-feira, 21 de julho de 2006

Alguns assumem

Júri nacional de exames assume erros no site das provas do secundário realizadas

O júri nacional de exames (JNE) retirou hoje do seu "site" o relatório que elaborou sobre os exames do secundário do ano passado porque o documento continha erros nos valores das médias, tal como noticia hoje o PÚBLICO, pelos quais pediu desculpa.
O PÚBLICO de hoje dá conta que o relatório final do JNE sobre as provas do secundário realizadas em 2005 disponível na Internet desde Novembro do ano passado contém médias erradas e colunas com títulos trocados.
A presidente do JNE, Elvira Reste Florindo, disse hoje à Lusa que "em alguns quadros do relatório as notas de 2005 foram trocadas pelas notas de 2004" e que a entidade a que preside "assume o lapso".
"A presidência do JNE assume que ocorreram efectivamente algumas trocas de valores de médias de classificações no Relatório Final dos Exames Nacionais dos Ensinos Básico e Secundário, publicado em Novembro de 2005. Pelo lapso, [o JNE] pede desculpa aos eventuais lesados", indica uma nota da entidade enviada anteriormente à Lusa.
Devido a estas discrepâncias "agora detectadas", o documento foi hoje retirado da página de Internet e o JNE está a proceder às rectificações para que o documento corrigido esteja online "o mais tardar até sexta-feira", disse Elvira Florindo.
As dúvidas forma suscitadas por dois professores de Esposende e levaram o Ministério da Educação a detectar as falhas no documento.
Os dois professores compararam - no dia em que foram divulgados os resultados dos exames do secundário deste ano - médias nacionais difundidas pela comunicação social com as notas de 2005 no relatório do júri nacional.
O documento indica que no caso da Química a média da 1ª fase tinha sido de 9,6 valores mas, quando os dados foram tornados públicos este ano referiam uma classificação de 10,9 valores.
De acordo com o jornal, os professores Ana Paula Correia e José Ribeiro não conseguiam perceber por que razão a tutela dizia que a descida tinha sido assim tão significativa.
Sabiam que a média deste ano se tinha ficado pelos 7,7 valores e, quando iam comparar com os dados da página oficial do júri nacional, não encontravam os 9,9 valores publicados nos jornais mas sim 8,3 - o que representaria então uma descida pouco significativa.
A presidente do JNE ressalvou no entanto que em Julho do ano passado, meses antes da divulgação do relatório com os erros, o JNE enviou a informação correcta sobre os exames à comunicação social.
Por outro lado, Elvira Reste Florindo afirmou que no seu relatório de Novembro o JNE fez a análise a apenas 21 disciplinas e que as estatísticas relativas a todas as 44 disciplinas em exame no ano passado foram divulgadas correctamente na secção "Estatísticas" em Dezembro."Esta é uma listagem completa dos resultados dos exames nacionais do secundário de 2005 (à) os quais podem ser utilizados para qualquer estudo tido por conveniente", esclarece por outro lado a mesma nota.

Ilegalidades

Ao ler-se o Despacho conjunto n.o 453/2004 de 7 de Julho, relativo aos Cursos de Educação e Formação da Direcção Geral de Formação Vocacional, no artigo 7º, ponto 2, alíena d), lê-se:


A equipa pedagógica que assegura a leccionação dos cursos assinalados dispõe de uma hora e trinta minutos (um tempo) de equiparação a serviço lectivo semanal, coincidente nos respectivos horários, para coordenação de actividades do ensino-aprendizagem;

Há alguma coisa aqui que se não perceba?



O engraçado é que as notas em «ORGANIZAÇÃO DO ANO LECTIVO 2006/2007 » desmentem o despacho. A palavra escrita em «algumas notas», ou seja, em apontamentos feitos ao sabor da pena, diz no III, 1. que...

Serviço lectivo corresponde ao tempo de leccionação das diferentes disciplinas do currículo. Todas as restantes tarefas, realizadas individualmente ou em grupo, são tarefas não lectivas.
Ora bem: depois de ler a LEI dos Cursos de Educação e Formação, o meu grupo fez a distribuição de serviço atribuindo a cada um dos colegas com CEFs o tempo correspondente para as respectivas reuniões. No dia seguinte fomos chamados pelo Executivo para refazer essa distribuição porque estávamos a seguir a LEI, mas a contrariar as NOTAS vinculativas dos nossos ilustres: não há lugar a redução para reuniões.
(Então como é? Não se fazem? Não é precisa equipa pedagógica?)
Será que a providência cautelar resulta?

Explicações

Não vi... (estava na escola a tentar resolver o M1, quando um familiar que há ainda pouco tempo lhe dava razão me telefonou para comentar o que estava a ver...)

«Eu assim não consigo falar!»...
Que pena nunca ter experimentado dar aulas a uma turma das escolas que agora tutela...
Com uma afirmação destas que regalados ficariam os miúdos! Que festim fariam!

quarta-feira, 19 de julho de 2006

Debaixo de fogo

A ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, está novamente envolta em polémica. Desta vez, por causa dos exames do 12º ano. Professores e pais dizem que há erros, Ministério da Educação não reconhece, mas permite a repetição das provas de Química e Física. Justificação oficial: as médias foram muito baixas. Mas os encarregados de educação querem que todos os exames possam ser repetidos.
A justificação do ministério para a repetição das provas baseia-se no facto de os alunos terem alcançado nestes dois exames um «valor médio relativamente baixo e muito inferior ao verificado no ano passado», obtendo uma média de 6,9 valores (numa escala de 0 a 20) a Química e 7,7 a Física.
A oposição quer explicações sobre o que se passou e associação de pais pedem a repetição de todos os exames. A ministra já garantiu que irá ao Parlamento na quinta-feira, a pedido do PSD, dar explicações sobre a forma como decorreram os exames no ensino secundário, mas recusou a possibilidade de todos os exames serem repetidos.
Mas as críticas também chegam do próprio PS. «Temos direito a saber o que é que falhou. Alguma coisa falhou. A ministra tem de dar uma explicação até para tranquilizar as famílias e sobretudo para que nós percebamos o que vai ser feito no futuro», afirmou António Vitorino, à RTP.
Entretanto, em Braga, os pais dos alunos do ensino secundário manifestam-se esta tarde, junto ao Governo Civil, pela possibilidade dos estudantes repetirem todos exames na segunda fase, sem prejuízo do acesso ao Ensino Superior.
A legislação em vigor prevê que qualquer aluno do 12º ano possa repetir um exame na segunda fase, por ter reprovado na primeira ou por pretender melhorar a nota. Contudo, se o fizer, fica automaticamente obrigado a concorrer apenas à segunda fase de acesso ao Ensino Superior, em Setembro.

domingo, 9 de julho de 2006

O eduquês

De 2003, mas também de 2006 ...

O eduquês e a pedagogia romântica nunca existiram...


por Nuno Crato
Jornal de Letras, Artes e Ideias – 27 de Novembro de 2003



Passa-se entre nós um fenómeno novo. Há um ou dois anos apenas, sempre que num debate sobre educação alguém exprimia alguma ideia contrária à corrente pedagógica dominante, as coisas aqueciam. Bastava que se falasse na necessidade de decorar a tabuada, na importância de aprender a ortografia, no combate à indisciplina, na importância da avaliação ou na necessidade de os alunos saberem meia dúzia de datas históricas. Bastava isso para que imediatamente chovesse um enxame de ataques acesos. Os críticos da pedagogia dominante eram classificados de reaccionários ou conservadores: não percebiam as novas abordagens, queriam voltar ao ensino acrítico e repetitivo...
Subitamente, tudo mudou. Dizem-se hoje as mesmas coisas e não aparece oposição aberta. Há discordâncias num ponto ou noutro. Coisas menores... ninguém afinal defendeu o que se diz que defendeu. As teorias delirantes sobre educação que, durante anos, ouvimos da boca de alguns teóricos da pedagogia romântica, essas teorias nunca foram formuladas... A linguagem esotérica depreciativamente classificada como «eduquês» parece que desapareceu. Pois é... o eduquês nunca existiu!
Os que dizem e mantêm as suas ideias, tanto em momentos favoráveis como desfavoráveis, merecem o maior respeito. Os que pensavam de uma maneira e alteraram o seu pensamento como resultado da reflexão merecem, igualmente, o maior respeito. Já o mesmo não acontece, pelo menos no plano intelectual, com os que defenderam ontem determinadas teses, defendem hoje outras e mantêm que, afinal, sempre tiveram razão. Há responsáveis políticos e teóricos da pedagogia romântica que disseram, por exemplo, que «a avaliação é o braço armado da selecção social (reprodutora das desigualdades)» e que, anos depois, quando os ventos mudaram, passaram a dizer que sempre defenderam o rigor na avaliação. Não devem essas pessoas ser confrontadas com o que disseram?
Há também os que tiveram responsabilidades governamentais e que defenderam, durante anos e anos, que a divulgação dos resultados das escolas oficiais não devia ser feita e que, agora, agora que essa divulgação se tornou norma e é vista como um direito democrático dos cidadãos e das famílias, agora... falam da divulgação dos resultados das escolas como de «um processo que deve ser melhorado». Não será natural que nos espantemos com tanta incoerência?

A CASSETE DO ROMANTISMO PEDAGÓGICO
É evidente que os teóricos da pedagogia romântica, dita progressista ou inovadora, não constituem uma corrente totalmente homogénea. E é evidente que os problemas devem ser discutidos cuidadosamente, ponto a ponto. Pode haver quem pense que se deve decorar a tabuada, mas defenda que não devem existir exames. Tal como pode haver quem condene o regulamento do ‘Big Brother’ nos manuais de português, mas pense que Camões deve regressar ao 10º ano. No entanto, a realidade é que há uma corrente pedagógica que se classifica a si própria como progressista e que, na realidade, é romântica e pós-moderna. E a verdade é que essa corrente teve um peso desmesurado no pensamento e na governação educativa em Portugal nas últimas décadas.
Há traços comuns a esse movimento que, em maior ou menor grau, estão presentes em programas aprovados, em decretos-lei e no discurso de muitos teóricos da pedagogia, alguns com papel preponderante em várias universidades e escolas superiores de educação. Será preciso fazer citações dos manuais usados para ensinar futuros professores? Será preciso reler alguns decretos-lei e discursos oficiais, repletos de uma confusa terminologia pós-moderna? Será preciso citar extractos dessa tristemente vaga cartilha ideológica sectária que é o «Currículo Nacional do Ensino Básico — Competências Essenciais» de 2001?
O epíteto de «romântico», não é derivado da falta de senso, apesar de muitos representantes dessa corrente defenderem ideias lunáticas, tais como as que citámos abundantemente em anterior artigo publicado neste jornal («A pedagogia romântica e a falta de senso», 1 de Outubro de 2003). Relembramos apenas aqui uma dessas ideias românticas extravagantes que uma professora de pedagogia, defensora confessa dos programas de matemática instituídos pelos românticos, escreveu e publicou em livro usado para ensinar futuros professores: «os conceitos matemáticos se desenvolvem espontaneamente nas crianças, não havendo necessidade de serem ensinados». Espantoso, não é? Posso citar a autora, o manual, a edição e a página. Mas valerá a pena?
Apesar destes dislates lunáticos, é por razões ideológicas que o epíteto romântico se aplica com propriedade a esta corrente. Permitam-me citar alguns conhecidos filósofos contemporâneos. Comecemos por Simon Blackburn, no seu “Dicionário de Filosofia”: «Romantismo. Movimento que varreu a Europa e daí a cultura americana [...] acima de tudo a elevação da natureza e do sentimento acima da civilização e do intelecto de acordo com Rousseau [...] predominância do subjectivo, do imaginativo e de emocional [... defesa da ideia da] espontânea inocência da criança corrompida pela separação intelectual com a natureza» (tradução minha a partir da edição inglesa, Oxford, 1994; existe tradução portuguesa da Gradiva, a que não tenho de momento acesso).
Mario Bunge, no seu “Philosophical Dictionary” (Prometheus, 2003), é ainda mais claro: «Romantismo. O movimento cultural complexo que começou com Vico e Rousseau e culminou com Hegel. Progressivo na arte, retrógrado na filosofia e ambivalente em política. Características principais: irracionalismo, obscuridade, holismo, desregramento, subjectivismo, fantástico, excessivo, nostálgico, desejo de associar a história natural (e não a ciência) com filosofia, religião e arte.»

ROUSSEAU EM VERSÃO ‘BIG BROTHER’
Não é só a influência de Rousseau entre os pedagogos ditos progressistas que os associa ao romantismo (como corrente intelectual e não estética, claro). São muitas outras das suas características «retrógradas na filosofia»: o repúdio pela tradição racionalista crítica, o desprezo pela cultura clássica, a defesa do predomínio da natureza e o apelo à espontaneidade em detrimento do intelectualismo e da valorização de conhecimentos.
Atentemos, por exemplo, no recente debate sobre a introdução do regulamento do ‘Big Brother’ em manuais de português. Pouca gente o disse, mas essa escolha tem fundamento na pedagogia romântica e foi por isso que vários elementos dessa corrente ficaram tão pouco à vontade no debate levantado por esse episódio incómodo. A introdução desse texto tem perfeito cabimento na filosofia que presidiu aos novos programas. A direcção da Associação de Professores de Português emitiu na altura um parecer público que muitos gostariam que hoje estivesse esquecido. Nesse parecer saudavam-se os programas do secundário pela «redução e flexibilização do corpus literário», nomeadamente pelo facto de ter deixado «de ser obrigatória a abordagem de textos de Gil Vicente, Bocage e Cesário Verde», sendo «dada a possibilidade de selecção de textos de acordo com os interesses e necessidades dos alunos». O parecer é muito claro, saúda «a redução do corpus» por permitir «o trabalho com uma grande diversidade de textos não-literários» (APP, Setembro de 2001).
É o romantismo anti-intelectual no seu melhor. Por um lado, a crença lunática no poder atraente do regulamento do ‘Big Brother’ e de textos similares para o posterior ensino do português (alguém acredita que são esses textos que despertam nos alunos o gosto pela leitura?). Por outro lado, a ideia romântica de que é preciso partir sempre dos interesses imediatos dos alunos, da sua «natureza» rousseauniana em versão pimba, e que esses interesses seriam ponto de passagem obrigatório, sem o qual não valeria a pena tentar o ensino da literatura.
Tudo aparece colocado de pernas para o ar. Para a aprendizagem do português são importantes os textos clássicos e a boa literatura, não só literária ou ficcional no sentido estrito, mas também ensaísta, narrativa e mesmo jornalística. Abundam aí textos de uma simplicidade que roça o elementar, mas que têm a dignidade da grande escrita. E a aprendizagem do bom português possibilita aos alunos a posterior abordagem e compreensão de «uma grande diversidade de textos não-literários». Essa deve ser a perspectiva da escola: chamar os alunos, antes de tudo, ao nosso património cultural. Há ou não há aqui duas perspectivas diferentes?

DO DISLATE À BANALIDADE
O drama da pedagogia romântica é que as suas afirmações inovadoras estão erradas e as suas afirmações verdadeiras são banais. Quando, pretendendo-se ser interessante e inovador, se diz, por exemplo, que é necessário «adaptar a matemática aos interesses dos alunos», está-se a proferir uma frase desprovida de sentido, conducente à fragmentação do conhecimento e desculpabilizante do insucesso. Quando se justifica esta frase dizendo que os alunos «aprendem melhor aquilo por que se interessam», está-se a dizer uma banalidade. Os alunos interessam-se pelo que se interessam... Até aí estamos todos de acordo.
Da matemática à escrita, o panorama é semelhante. Quando se defende que a leitura tem de começar pela escrita, está-se a produzir uma afirmação contestada pela psicologia experimental e claramente contrária à ordem lógica das coisas. Será isso mesmo que se quer dizer? Essa ideia pode ser inovadora e interessante, mas está errada. Se, pelo contrário, se defende apenas que a escrita ocupa um lugar central e que esta se deve articular com a leitura reforçando-se mutuamente as duas práticas, está-se a granjear um consenso e marcar uma distância em relação ao dogmatismo da pedagogia romântica.
Não terá chegado o tempo de sacudirmos o jugo do dogmatismo pedagógico e de encararmos as realidades do ensino sem os preconceitos românticos retrógrados? Há muita gente, provinda de lados diferentes, que pensa que sim. Seria bom que assim fosse e que se pudesse caminhar para práticas de ensino temperadas pela experiência e pelo bom senso.

quarta-feira, 5 de julho de 2006

D. João de Castro

Escola secundária D. João de Castro é «prejuízo»
2006/07/05 15:45

Ministério defende fecho do estabelecimento. Pais avançam com providência cautelar

O Ministério da Educação defende que a manutenção da secundária D. João de Castro, em Lisboa, representa um prejuízo para o interesse público, uma posição contrariada pelos pais na providência cautelar que interpuseram contra o fecho da escola, noticia a agência Lusa.

Na resolução enviada para o Tribunal Fiscal e Administrativo de Lisboa (TAFL) em resposta à providência cautelar interposta a 19 de Maio pela associação de pais e pelas Juntas de Freguesia de Alcântara e Ajuda, o Ministério da Educação sustenta que a continuação do funcionamento da escola «seria gravemente prejudicial para o interesse público».

No documento, subscrito pelo secretário de Estado da Educação, Valter Lemos, e enviado no final de Junho para o TAFL, pode ler-se que a decisão de encerrar a D. João de Castro surge no âmbito de medidas com vista ao «reordenamento e redimensionamento do parque escolas (...) numa perspectiva de racionalização e optimização dos recursos físicos, humanos e materiais que lhe estão afectos».

De acordo com o governante, o estabelecimento de ensino tem capacidade para 42 turmas e um total de 1.050 alunos, mas neste ano lectivo funcionou com 296 alunos, distribuídos por 17 turmas, dos quais «somente 150 reúnem condições para prosseguir os seus estudos» naquela escola.

O ministério destaca que a secundária está instalada numa área pedagógica - Restelo/Ajuda/Alcântara/Santo Amaro - onde se registou nos últimos anos um «acentuado decréscimo da população em idade escolar» e garante que «para todos estes 150 alunos existe resposta» nas restantes escolas secundárias da mesma área: a Rainha Dona Amélia, a 100 metros, e a Fonseca de Benevides, a 600 metros.

Posição completamente diferente tem a Associação de Pais e Encarregados de Educação dos Alunos da Escola Secundária D. João de Castro e as juntas de freguesia de Alcântara e da Ajuda, que avançaram com a providência cautelar contra o encerramento do estabelecimento.


Comentários dos leitores

"racionalizar"
to
2006-07-05 16:56
Este governo vem com estas tretas da "racionalização" de recursos para tudo, mas em vez dos serviços melhorarem, só pioram! É fechar escolas, fechar centros de saúde e maternidades! Eu sei que ainda é cedo para ver os efeitos destas medidas, mas será que alguém acredita mesmo que irá melhorar alguma coisa nos serviços com estas medidas? É óbvio que isto são apenas cortes para reduzir despesas. Neste caso, parece ser ainda mais grave, porque se o que a 1ª pessoa que comentou esta noticia tem razão, isto é pura especulação imobiliária!
O que não disse...

FM
2006-07-05 16:38
O que o Sr. secretário de Estado não disse é que a Escola tem esses alunos porque há dois anos que cortaram as turmas do 7º ano, e não deixaram que se avançasse com um protocolo com a casa pia para a utilização das infraestruturas da escola, não deixam que se inscrevam novos alunos, que existiam na Ajuda e Alcântara e continuam a existir, como aliás o presidente da J.F. não se cansa de repetir.
O que o Sr. secretário de Estado não diz, é que provavelmente interessa muito mais ao Estado vender o local onde está instalado o liceu do que a vontade de umas poucas centenas de alunos.
Não nos atirem areia para os olhos!
Mas mais ainda, o que o Sr. Secretário de Estado não disse é que a D. João de Castro está entre as 30 melhores escolas no ranking, tem um excelente ensino, e que pretendem enfiar os alunos na Fonseca de Benevides, uma escola sem condições, sem pátio para os alunos, e provavelmente sem valor imobiliário.
Dizer que a continuação do funcionamento da escola «seria gravemente prejudicial para o interesse público» é, no mínimo, ridiculo.

Uma mulher obcecada!

M.L.R.
2006-07-05 16:34
Mais uma da "sinistra" da Educação: só lhe interessa "poupar" dinheiro e entregar o Ensino Público aos empresários privados.
Os pais que abram os olhos, muitos têm aplaudido os ataques da sinistra aos professores, tarde ou cedo verão que os seus filhos vão ser os principais prejudicados.
A "sinistra" é incompetente e não passa de uma obcecada com as questões orçamentais e o ódio aos professores.
Veremos o que vai sair no lugar...

Ingénuo
2006-07-05 16:31
da escola que só dá prejuízo. Tem menos alunos, óbvio, pois "encafuamos" os alunos daquela zona em escolas, sem vista para o mar, Fonseca Benevides e Rainha D. Amélia que se encontram degradadas, sem condições e sobrelotada para quê???
Talvez, para que em lugar de uma escola, se construa um equipamento privado de Luxo, onde alguns (Sr. Valter Lemos quanto é a sua parte?)ganharão rios de dinheiro à conta de património do estado, e continua assim a descapitalização imobiliária do estado em favores de poucos.
Gostava de saber...

Carlos Portugal
2006-07-05 16:13
Gostava de saber como e onde é que a existência de uma escola - ainda por cima com as características excepcionais da D. João de Castro - pode ser «prejudicial» para a população... A D. João de Castro possui das melhores instalações do País, ao contrário das «modernices» que por aí têm proliferado, mal pensadas, mal arquitectadas e geralmente pessimamente construídas.

A população estudantil da zona está a registar um aumento quase exponencial, ao contrário da realidade virtual apregoada pelo ministério (onde irá este arranjar dados tão absurdos? É que para tal imbecilidade também é preciso imaginação); e as escolas Fonseca Benevides e Rainha D. Amélia estão já a rebentar pelas costuras.

Quanto à D. João de Castro ter menos alunos que a sua capacidade, isso deve-se exclusivamente ao ministério e à DREL, que forçaram o encerramento de turmas ao longo dos últimos anos, numa espécie de «numerus clausus», como preparação da «golpada» agora ensaiada.

Realmente, o «senhores» do grupo Bilderberg, que já detêm o hotel do Alto de Santo Amaro, querem alojamentos de luxo e um SPA para os seus apaniguados. E os terrenos da D. João de Castro são fabulosos, com uma vista ímpar para o Tejo.

O que não se compreende é a vergonhosa compactuação das entidades públicas com estes mesquinhos e sujos interesses imobiliários, isso sim em prejuízo flagrante do interesse público.

Saudações - a quem luta pela manutenção desta excelente Escola - de um antigo aluno do (então) Liceu D. João de Castro.

in Portugal Diário-5.07.06

terça-feira, 4 de julho de 2006

Direito de Resposta

Exame II

Falta de sensibilidade e de sensatez na elaboração dos exames é o comentário que Carmo Vieira faz a propósito do conteúdo das provas de Português, nos ensinos Básicos e Secundário. Para esta professora, em vez de se premiar o esforço dos alunos, impera o facilitismo e o convite à preguiça
por Carmo Vieira

Os exames de Português do 12.º ano são o exemplo, não só da falta de rigor científico e de exigência na sua elaboração, mas também da manifesta indiferença pelo trabalho e pelo esforço desenvolvidos por professores e alunos, ao longo do ano. Não é aceitável o facilitismo, o convite à preguiça ou a penalização de quem estudou e foi assíduo às aulas, nem tampouco a incorrecção na formulação de várias questões pelos ditos «professores seniores do Ministério» ou a pobreza da interpretação proposta quer para o poema de Fernando Pessoa, «O Menino da sua Mãe», quer para o extracto da narrativa de Saramago, «Memorial do Convento». Estes são os aspectos, que em nossa opinião, caracterizam os dois exames, nomeadamente o que se refere à antiga reforma (n.º 139) e o que responde ao «programa novo implementado a partir de 2003/2004 (n.º 639). De realçar ainda, na prova que analisa o poema de Pessoa (n.º 139) o facto de se oferecer aos alunos a explicação de algum vocabulário, nomeadamente «plaino: planície; exangue: sem sangue e langue: mortiço; sem brilho». Num texto poético que só muito raramente os alunos não terão lido em aula, não se aceita a preocupação em explicar e oferecer mastigado o sentido de vocábulos, que os alunos deveriam conhecer. Um exemplo de facilitismo, em que o convite ao culto da passividade e da dependência é flagrante.

Exame de Português

Editorial da Revista Pontos nos iii
O logro

por Santana Castilho

O exame de Português do 12.º ano é o paradigma de uma política e de uma estratégia marcadas por um facilitismo intolerável e uma falta de rigor e de responsabilidade socialmente criminosas. Não surpreende quem esteja atento ao desastre em que se consubstanciam as medidas da ministra da Educação. Mas revolta por ser uma ode à preguiça e ao ridículo e por se constituir em afronta aos professores sérios e aos estudantes aplicados. A polémica a propósito da existência ou não de exames é recorrente. Mas, na senda do estatuto editorial que definimos, onde defendemos o pluralismo de opiniões sem que tal signifique o abandono ou a dissimulação da nossa própria opinião, afirmamos peremptoriamente que os exames, como elo de validação, perante a sociedade, do trabalho feito na sala de aula, como instrumento de certificação externa desse trabalho e como meio de relativização de critérios díspares entre escolas integrantes de um sistema massificado e não suficientemente supervisionado, são incontornáveis e essenciais. Desde que sérios, exigentes, produzidos com competência, técnica e científica. Certamente que não houve instruções explícitas aos sábios que conceberam os exames nacionais que tivemos ocasião de analisar (Português B, Sociologia, Biologia e História do 12.º ano e Português do 9.º ano) no sentido de os pré-ordenarem para a melhoria dos resultados estatísticos. Mas que servem esse desígnio, servem. Que obedecem ao lugar comum da linguagem e da doutrina pedagógica imposta como oficial por um ministério incapaz e por uma ministra dela prisioneira, obedecem. Não precisamos de um profeta para imaginar que, num futuro próximo, ouviremos laudas de vitória às medidas deste governo. Mas… o combate sério ao insucesso escolar só pode ser ganho com a coragem de gerar insucesso estatístico, repudiando a desvalorização do que é fundamental em benefício de teorias e práticas vazias de sentido, que vêm a fossilizar a generosidade e a dedicação dos professores; com o reconhecimento de que o trabalho e a exigência são indispensáveis à aquisição do conhecimento, que precede a posse das decantadas competências; com a noção de que um sistema de ensino que se oriente para a satisfação prioritária de necessidades logísticas de pais ocupados e alunos preguiçosos e relapsos é um logro.

Santana Castilho

A insuperável incapacidade da ministra da Educação

Não é a primeira vez que me interpelam questionando-me assim: mas será que não encontras uma só coisa positiva na actividade da ministra da Educação, de forma a que não digas sempre mal do que ela faz? A crónica de hoje é uma pequeníssima parte escrita do que respondi, em amena conversa, ao último interpelante, um amigo, velho militante do PS, economista, aterrorizado pelo eventual homicídio da República às mãos do défice, recém-convertido, por essa paranóia, ao neoliberalismo selvagem.
De facto, não encontro uma só coisa que me mereça aprovação, o que não significa que discorde, a montante, de todas as intervenções havidas. Como assim? É que as que em simples propositura me dariam bem, são, a jusante, irremediavelmente destruídas pelos processos escolhidos.
A ministra não tem, conceptualmente, estrutura para discursar sobre os problemas em que pretende intervir. É confrangedor verificar, sempre que procura argumentos, a inconsistência das opiniões que emite como se fossem factos. Do que vai dizendo, retira-se o desconhecimento constante dos conceitos a que alude. Mas, sobretudo, está possuída por um sentimento obsessivo, próximo do ódio aos professores, que dela exala de cada vez que se lhes refere. Superficializa ou generaliza indevidamente, estragando sempre tudo. É uma catástrofe! Vão alguns exemplos:

1. Centrar nos docentes de sala de aula, por forma reincidente e inequivocamente consciente, a responsabilidade pelos males do ensino, como se não coubesse aos políticos e à casta de pensadores e assessores em que se apoiam a definição das políticas e dos processos de as implementar, é uma de duas coisas: má-fé ou ignorância.

2. As "aulas de substituição", o prolongamento do tempo de permanência das crianças na escola, o fim dos trabalhos para casa, o aumento das cargas curriculares das disciplinas em que o fracasso é maior, etc. são medidas demagógicas, populistas e inadequadas, com que a ministra pretendeu contentar as necessidades imediatas de pais que não sabem o que fazer aos filhos enquanto trabalham.
Quando um professor falta, uma escola organizada pode e deve prover uma aula de substituição ou uma actividade de compensação. São coisas diferentes, que a ministra nunca entendeu. Não se pode fazer isso ludibriando as regras contratuais, como a ministra fez. Actividades desse tipo têm que ser úteis, não servindo as ocupações grosseiramente caricatas que se generalizaram, nem os processos arcaicos de encurralamento de docentes aos magotes em salas, à espera do acaso, sem critérios e aviltando a dignidade de todos. A ministra não percebeu que há escolas que não têm recursos para executar um programa desse tipo. A ministra ignora que, face à cultura organizacional vigente, de obediência cega aos papéis, a pressão posta pelos serviços e a ausência de directivas sensatas só poderia gerar bagunça. A ministra não conhece as escolas que tutela, as pessoas que comanda e, depois de ter a confusão exposta na praça pública, fingiu que a não via ou, pior ainda, não se deu conta dela.
As crianças passam na escola mais tempo do que os operários estão nas fábricas. Muitas escolas, demasiadas escolas, são inóspitas como, felizmente, já o não são a maioria das fábricas. A ministra passa olimpicamente a leste dessas realidades. A ministra não compreendeu que o problema do ajustamento social a um novo paradigma de vida é tarefa que não cabe à Escola só, muito menos pode ser cumprido pela maioria das escolas que tem. A ministra é inconsistente quando diz que as crianças têm que progredir sozinhas acompanhadas para liquidar os trabalhos de casa e amarrá-las mais tempo à escola e aos professores. Desfechou, assim, mais uma machadada no valor do trabalho, reforçou o culto do facilitismo e ao "eduquês" somou o "sociologês", invocando que os trabalhos de casa acentuam clivagens entre os filhos de pais cultos e os filhos de pais menos letrados. Como se os pais de hoje fossem mais ignorantes do que eram ontem, ou a lógica dos trabalhos para casa se resumisse a esse deve/haver parental de culturas. A ministra ilude-se quando pensa que combate o insucesso com mais horas do mesmo. A ministra terminará o mandato sem entender que o verdadeiro insucesso se combate com medidas adequadas de gestão, que aumentarão, irremediável e temporariamente, o insucesso que a preocupa, o estatístico. Aqui ficam, a mero título de exemplo, algumas dessas medidas indispensáveis, que ela jamais assumirá, por falta de coragem e de competência: intervenção profunda no modelo de gestão das escolas, autonomizando-as, responsabilizando-as e entregando a respectiva direcção aos mais competentes; radical mudança na estrutura orgânica dos serviços centrais do ministério, que deviam estar estritamente orientados para a definição de políticas assentes em estudos e dados, supervisão da qualidade, gestão orçamental e gestão dos desempenhos e inovação de processos e de recursos; reformulação de programas, marcada pela exigência e diminuição do número de disciplinas e de horas curriculares; recuperação da homogeneização das turmas; implicação séria das organizações locais e comunitárias nas actividades extracurriculares; radical alteração dos normativos disciplinares escolares com a devolução clara da autoridade ao professor e consequências evidentes para o tratamento rápido dos incidentes; imposição de exames nacionais em todos os fins de ciclo, com peso relevante na classificação dos alunos.