quinta-feira, 29 de junho de 2006

Ensinar?

Tarefas dos professores
por José Luiz Sarmento

Na proposta de estatuto docente apresentada pelo governo conta-se uma extensa lista de tarefas a atribuir aos professores. Pensei em apresentá-la aqui e fazer uma análise exaustiva da sua pesadíssima carga ideológica; enumerar as contradições, os abusos, as omissões, os solecismos, as redundâncias, as manhas, as imprecisões; e mostar como a aplicação desta lista vai levar a que o Estado obtenha professores bons ou obedientes, mas nunca bons e obedientes.
Mas não. O «eduquês» em que o documento está escrito é realmente um jargão intragável e quero poupá-lo aos meus leitores. Ainda pensei em traduzi-lo para português, mas qualquer tradução seria, neste caso, um comentário, e para comentar um tal chorrilho ficaria aqui «cantando, sem o sentir, mil anos».
Decidi em vez disso contar a frequência de certas palavras e ver que inferências poderia tirar desta contagem. E são inferências bem curiosas, como se verá adiante. Não resisto, porém, a mencionar primeiro que duas das tarefas enumeradas (alíneas g) e h)) começam pelo verbo «utilizar» - o que traduz a ideia, conceptualmente interessante, de que um meio pode ser um fim.O documento precisa de 531 palavras para atribuir aos professores 29 tarefas. É obra! Entre tantas tarefas seria de esperar que se contassem, muito singelamente, as de dar aulas ou ensinar: pois não se contam. As palavras «aula», «aulas», «lição» e «lições» ocorrem, no total, zero vezes.

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