quarta-feira, 10 de janeiro de 2007

Ilegalidades

Mais uma aluna de Coimbra repetiu exame de Química

Bárbara Wong

Ordem dos Advogados diz que situação deveria ter sido resolvida antes de chegar aos tribunais
Aconteceu no dia 12 de Dezembro do ano passado. Uma aluna da Escola Secundária da Quinta das Flores, em Coimbra, fez o exame nacional de Química. Subiu assim para cinco o número de casos conhecidos de estudantes que recorreram aos tribunais e conseguiram ver ser-lhes reconhecido o direito de repetir a prova. O Ministério da Educação poderia ter evitado estes casos, diz a Ordem dos Advogados.
Vários estudantes recorreram a diferentes tribunais administrativos e fiscais, em Coimbra, Leiria e Viseu, alegando que não tiveram a mesma oportunidade que foi dada pelo Ministério da Educação (ME) aos colegas que puderam fazer as provas nas 1.ª e 2.ª fases. A tutela decidiu, a meio da época dos exames do ano lectivo passado, permitir que os estudantes pudessem repetir as provas de Química e de Física. Só que os alunos que decidiram fazer as provas na 2.ª fase, cerca de dez mil, não tiveram a mesma possibilidade. Por isso, alguns recorreram aos tribunais, alegando que não houve igualdade de oportunidades para todos.
"Teria sido bom que no plano administrativo se tivesse conseguido evitar a intervenção dos tribunais e repor a plena igualdade ao dar uma segunda oportunidade a todos os alunos", defende o bastonário da Ordem dos Advogados, Rogério Alves.
Também Carla Amado Gomes, assistente da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, concorda que a tutela deveria ter dado uma segunda oportunidade a todos os alunos. "O Estado devia ter aberto uma época especial para todos a quem não deu essa hipótese", diz.

Aprofundar a desigualdade
Agora, por cada vez que a tutela cumpre uma decisão dos tribunais administrativos, está a "renovar a violação do princípio de igualdade" relativamente a todos os outros que não tiveram igual opção. "Cada aluno que realiza essas provas, fá-lo em circunstâncias desiguais", defende.
Só que essa "desigualdade" não é imputável ao ME, mas aos tribunais, alerta o professor de Direito Administrativo da Universidade Católica Portuguesa, Luís Fábrica. "Ao Ministério cabe apenas executar rigorosamente a sentença - é inadmissível que sobreponha o seu juízo ao do tribunal e diga: "Não executo a sentença, porque isso só vai piorar as coisas"", explica.
Os tribunais têm decidido que o ME deve realizar nova prova de Química e que, no caso de as notas possibilitarem a entrada nos cursos pretendidos, sejam abertas vagas pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior.
Foi o que já aconteceu a dois alunos, que estão a frequentar Medicina, na Universidade de Coimbra. Anteontem houve um estudante de Viseu que fez a prova de Química e soube-se ainda que há um aluno de Leiria que se está a preparar para a nova prova. O caso de mais uma aluna de Coimbra, da secundária Quinta das Flores, a quem foi dada a oportunidade de repetir o exame só ontem foi conhecido. A jovem obteve 18,4 valores na prova, mas o PÚBLICO desconhece se a classificação lhe abriu as portas ao curso pretendido. A Universidade de Coimbra ainda não foi contactada pelo ministério de Mariano Gago, que não comenta.
Conhecer os seus direitos
Haverá injustiça social pelo facto de alguns alunos terem recorrido aos tribunais e outros não? Não, porque o que aconteceu é que quem não fez queixas foi porque se conformou com a situação, considera Luís Fábrica. Ou não o fez porque desconhecia os seus direitos, acrescenta Rogério Alves: "A Ordem dos Advogados tem militado por informar todas as pessoas dos seus direitos.
"O Código de Processo dos Tribunais Administrativos abre a possibilidade aos alunos que não recorreram à justiça de poderem fazer os exames. Mas, para tal, será necessário que existam cinco casos individuais cujas sentenças finais sejam "perfeitamente idênticas", de maneira a pedir a extensão dos efeitos. Ou seja, é preciso esperar pelos resultados dos recursos dos dois ministérios e que estes confirmem as sentenças favoráveis aos alunos.
Isto pode demorar muito tempo, porque os ministérios recorreram aos tribunais centrais administrativos e podem ir até ao Supremo Tribunal Administrativo, caso as sentenças lhes sejam desfavoráveis.
Tudo isto poderia ter sido evitado, reforça Rogério Alves. "A intervenção dos tribunais pode dar origem a decisões divergentes, demoradas e que lançam insegurança na vida dos estudantes", conclui.

Ministérios não comentam
Os ministérios da Educação e da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior não comentam, nem disponibilizam informação sobre o caso dos exames de Química. "O senhor ministro diz que já deu todas as explicações sobre o assunto e que não comenta", declara Dulce Anahory, assessora do ministro Mariano Gago depois de o PÚBLICO colocar algumas questões sobre as situações conhecidas esta semana. Também o assessor de imprensa da Educação, Rui Nunes, diz que "não há nada a adiantar": "Os tribunais estão a funcionar."
Quando foi conhecido o primeiro caso de uma aluna de Coimbra a quem o tribunal decidiu que o Ministério da Educação deveria fazer o exame, Maria de Lurdes Rodrigues deixou claro que a tutela cumpriria a ordem judicial. Quanto a Mariano Gago, informou, nos dois casos de alunos de Coimbra, que a tutela iria criar as duas vagas adicionais na Faculdade de Medicina de Coimbra para estes alunos serem admitidos. B.W.


Público.10.01.2007

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