quinta-feira, 4 de janeiro de 2007

Pimba

O Ministério pimba da Educação

Desidério Murcho, Professor de Filosofia


Público.4 jan.2007


A propósito do livro Desastre no Ensino da Matemática: Recuperar o Tempo Perdido, organizado por Nuno Crato, Edições Gradiva, 2006

Os Encontros de Caparide foram uma louvável iniciativa do Ministério da Educação, que pretendia ouvir as sociedades científicas sobre o ensino de algumas disciplinas fundamentais (Português, Matemática, Filosofia) cujas deficiências a nível de currículos são gritantes. Foram tempos áureos, em que um ministro da Educação, David Justino, se preocupava com questões relacionadas com o ensino e não apenas com questões laborais e meramente organizacionais. O cerne da excelência do ensino é a solidez científica dos currículos e a formação científica dos professores, mas as discussões públicas nacionais sobre educação nunca abordam estes aspectos centrais. Até parece que tudo o resto é que é a finalidade do ensino, quando na verdade são apenas meios.
Dos Encontros de Caparide resultaram dois livros. O primeiro, dedicado à Filosofia (Para a Renovação do Ensino da Filosofia, Plátano), foi publicado no início deste ano. E este volume, dedicado à Matemática, surgiu agora. No primeiro caso, trata-se de discutir uma proposta concreta que visa melhorar a qualidade científica e didáctica dos programas de Filosofia do ensino secundário. No segundo, trata-se de discutir questões pedagógicas gerais que afectam não apenas a disciplina de Matemática, mas todas as outras.
As desastrosas doutrinas pedagógicas que imperam em Portugal, algo pós-modernaças e "construtivistas", são elitistas - apesar de fingirem o contrário - e têm por denominador comum um ódio visceral às Ciências, à Matemática, à História, à Gramática, à Literatura, à Filosofia; enfim, a tudo o que se pareça com verdadeiros conteúdos escolares. Em vez de conteúdos, fala-se de competências - como se pudesse haver competências sem conteúdos. E em vez de se distinguir cuidadosamente o que são verdadeiros conteúdos escolares do resto, procura-se transformar a escola numa espécie de entretenimento com ademanes de educação para a cidadania - tudo, menos ensinar seriamente Matemática ou Geografia ou Filosofia ou História ou Música. A origem destas ideias remonta a Rousseau e à fantasia do bom selvagem, e o que se visa é acabar com as Ciências, as Artes e as Letras, pois tudo isso corrompe a criança, que é presumivelmente mais feliz a ver televisão e a jogar à bola. Claro que tudo isto é fantasioso porque para andar a entreter os meninos com conversa fiada não é preciso escola: as crianças divertem-se muito mais fora da escola, e no mundo de hoje não têm sequer tempo para se aborrecer.
Fantasioso é também querer certificar manuais escolares quando os programas das disciplinas, que foram certamente certificados pelo próprio ministério, são o locus classicus do erro científico e do disparate pedagógico. Em muitos casos, para que um manual seja cientificamente bom e pedagogicamente adequado, é obrigado a não respeitar o programa. Isto porque os programas se degradaram de tal maneira ao longo dos anos que, hoje em dia, ao ler um programa curricular de Filosofia ou Português ou outra disciplina, uma pessoa pergunta-se onde está a Filosofia ou o Português. Os pedagogos ministeriais impuseram ao país a original perspectiva de que se pode ensinar Português sem Português, Filosofia sem Filosofia e Matemática sem Matemática. Ao mesmo tempo que os estudantes são massacrados com inúmeras disciplinas vácuas sem qualquer centralidade escolar, não têm uma educação básica em Música, nem em Literatura ou Filosofia ou Geografia. Se um estudante de 15 anos quer saber alguma coisa sobre estas coisas, tem de o fazer fora da escola. Mas se quiser brincar aos índios, pode fazê-lo nas chamadas "actividades educativas", em substituição das aulas de Matemática. É esta a educação pimba que temos.
Mas não é esta a educação que a sociedade, no seu todo, quer. Os pais, com maior ou menor formação escolar, queixam-se de que a escola não ensina. Os miúdos cantam, com razão, que "na escola nada se cria, nada se transforma, tudo se perde". Os professores andam há anos a denunciar este estado de coisas. Mas os pedagogos ministeriais vão passando de governo para governo, conseguindo ora mudar a Gramática toda, prejudicando gravemente a possibilidade da excelência do ensino do Português (se antes poucos professores sabiam e ensinavam Gramática, agora ainda menos - ou será que a ideia é mesmo essa?), ora suspender documentos que introduzem conteúdos científicos sérios num programa que carece deles (como foi o caso da badalada suspensão das Orientações de Leccionação do Programa de Filosofia). A ideia de trabalhar pelo bem do país, pela excelência do ensino, em defesa do interesse público, é alheia a estes originais pedagogos.
Numa cultura como a portuguesa, na qual nunca se valorizou realmente o conhecimento - afinal, no tempo da outra senhora, o conhecimento era um ornamento social para exibir em conversas amenas enquanto se tomava chá -, compete à escola entusiasmar os jovens e a sociedade, dando-lhes uma percepção clara do valor intrínseco do conhecimento. Mas quando é o próprio ministério da educação que não acredita no valor intrínseco do conhecimento, dificultando cada vez mais o estudo aos muitos professores sérios que temos por esse país fora, afogando-os em trabalho burocrático e em horas contabilizadas nas escolas só para marcar ponto, que se pode esperar do nosso futuro? Como poderemos recuperar o tempo perdido, tanto no que respeita ao ensino da Matemática como no que respeita às outras disciplinas? Seja qual for a estratégia, o primeiro axioma tem de ser este: o conhecimento tem valor intrínseco, em si e por si, e é do maior interesse público protegê-lo e transmiti-lo, e ensinar a produzi-lo - e só a escola pode fazer isso, ainda que infelizmente o tenha de fazer contra o Ministério pimba da Educação.

Exames 2007

Indicações para Exames

Continuam a não fornecer informações sobre grupos e seus pesos relativos na prova de Português de 12º.

terça-feira, 2 de janeiro de 2007

Follow Through

Novo ano, velhas práticas aparentemente mais proveitosas... Post e comentários no blogue do Paulo Guinote a não perder.



(...)
(Pois claro que não...)
I, personally, would not advocate mandating Direct Instruction, even though it was the clear winner. I don't think that mandates work very well. But every educator in the country should know that in the history of education, no educational model has ever been documented to achieve such positive results with such consistency across so many variable sites as Direct Instruction. It never happened before FT, and it hasn't happened since.

domingo, 31 de dezembro de 2006

Bom ano 2007



...ou, pelo menos, melhor que os anteriores...

terça-feira, 19 de dezembro de 2006

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

Estratégias...

O exame intermédio de Matemática de 12º ano foi MUITO mais fácil que o mesmo do ano lectivo anterior. (Enorme e satisfeita estranheza entre os alunos que resolveram nas aulas o do ano anterior e se depararam com este...) Se o exame final for deste tipo...

Já estou a ver as parangonas nos jornais com o discurso rejubilante da nossa ministra:
Plano nacional da Matemática, implementado por este Executivo, mostra os primeiros resultados!

domingo, 10 de dezembro de 2006

Avaliação

Gosto muito de «ler» a teia das reflexões da Teresa...

Finalmente!

Fiz estes dois últimos testes com a estrutura de exame.

  • Grupo I - Perguntas de interpretação de um texto;
  • Grupo II - Perguntas de escolha múltipla e correspondências;
  • Grupo III - Texto expositivo/argumentativo.

Cerca de onze horas para ver o primeiro grupo; à volta de três para ver o segundo; mais de 6 horas para ver o terceiro. (Tenho de arranjar maneira de ser tudo cruzinhas...)

Aqui está o exemplo de um aluno que há 3 anos insiste em fazer companhia a mim e a alguns colegas meus:





e exemplo de um que me vai sair rapidamente das mãos:




Depois de passar 20 horas à volta de 40 testes + 1 a coligir toda a informação, acabei a avaliação de 2 turmas.
Contei os trabalhos de casa; lancei todas as notas, das 2 fichas feitas na aula e das 8 feitas no moodle, no excel, para chegar à média; juntei as 2 dissertações e a oitava que fizeram e apreciei tudo.

Custou, muito, mas já está. Estou feliz! (ainda por cima há poucas negativas!)



Amanhã poderei olhar para as minhas filhas e ajudar a mais nova que ainda vai ter dois testes.



Quer isto dizer que na próxima semana só trabalharei 14? Ah pois está claro que não!

sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

E continua...

Excertos de «ELEMENTOS PARA UMA CRÍTICA CIENTÍFICA DA TERMINOLOGIA LINGUÍSTICA PARA OS ENSINOS BÁSICO E SECUNDÁRIO (TLEBS)»
de João Manuel de Andrade Peres
Linguista, professor catedrático
da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
(...)
Não obstante o que afirmei na secção anterior acerca do papel dos linguistas na avaliação de uma terminologia linguística, é com pena que verifico que, entre as vozes críticas da TLEBS que nos últimos meses surgiram nos jornais e na televisão, estiveram muito poucos linguistas (tanto quanto me apercebi, apenas Jorge Morais Barbosa, catedrático da Universidade de Coimbra). Este facto perturba- me, pois dele resulta a imagem ilusória de que estamos todos a cerrar fileiras em defesa da Terminologia. Sei que isto não é verdade e reputo importante que o país o saiba. Por isso avanço agora com esta posição pública, apesar de me ser penoso pôr em causa o trabalho de colegas e possivelmente magoá- los, de tal modo que por muito tempo protelei a iniciativa e pelo menos três vezes contactei uma das autoras da TLEBS, responsável por algumas das partes que considero mais problemáticas. A primeira reacção desta Colega de departamento foi de surpresa e alguma displicência, mas, num segundo momento, informou-me de que se previa uma revisão para Setembro passado e alertou-me para que uma intervenção pública da minha parte poderia pôr em causa o trabalho de muitos anos de linguistas em prol do ensino da gramática. Setembro passou, estamos em Dezembro e nada vi ou me foi dito até hoje que justifique a manutenção do silêncio.
À circunstância que acabo de expor acresce o facto de o público estar a receber uma imagem dos linguistas que quase faz deles um bando de incompetentes malfeitores que teria por objectivo torturar professores e alunos e pôr de rastos o ensino do português.
Não conheço nenhum linguista a quem assente bem esta (minha) descrição hiperbólica, mas entendo perfeitamente que alguns de nós sejam acusados de ter agido de forma pouco profissional.
(...)
Tenho plena consciência de que, ao intervir, poderei afectar o prestígio de alguns linguistas e reduzir a margem de influência que tenham conquistado. Porém, considero de muito maior monta o prejuízo que esses mesmos linguistas estão, com a TLEBS, a infligir a muitos milhares de crianças e jovens deste país e a alguns milhares de docentes.
Depois de muito instado por antigos alunos que hoje são professores de português, opto, como considero ser de boa norma, pelo mal menor e procedo como quem cumpre um dever cívico. Faço-o na esperança de que mais vozes se ergam, levando o Governo a tomar consciência da gravidade da situação, da qual se constituiu responsável último, ao ter-lhe dado força de lei, não obstante o processo ter sido herdado, praticamente concluído, de governos anteriores (o que é de rigor afirmar, como aliás tem sido feito, mesmo por uma voz insuspeita de preferência política pela actual governação, como é a de Graça Moura).
(...)
A meu ver, a TLEBS não é um objecto inaceitável pelo facto de ser inovadora nos termos (ainda que as inovações possam ser discutíveis), nem por nela se pretender assumir uma postura científica, nem por conter termos de estrutura complexa e difícil de apreender. Não, a TLEBS deve ser rejeitada, antes de mais, porque cientificamente não merece crédito (quod est demonstrandum, obviamente). Adicionalmente, e dado o fim a que se destina a Terminologia, não é também despiciendo o facto de que, mesmo que ela tivesse mérito científico, se tornaria um objecto inútil por não ser servida por materiais de consulta sólidos, nomeadamente uma boa gramática do português de perspectiva inovadora, que não existe. Acresce ainda que a TLEBS é chocante pela sua insensatez no que respeita a extensão, pelo carácter abrupto (direi mesmo brutal) do seu modo de introdução (por oposição a um processo eventualmente faseado ao longo de anos) e pela insensibilidade que revela à importância da coesão inter-geracional, criando rupturas absolutamente inúteis.
Antes de formular as minhas críticas, respondo a uma pergunta que pode surgir no espírito de quem me lê: mas, então, a TLEBS não está já avaliada e creditada cientificamente, uma vez que a sua base de dados de definições foi elaborada exclusivamente por docentes universitários? Lamento responder que não está. Pelo menos por três razões, as duas primeiras das quais espero que fiquem evidenciadas no presente texto: em primeiro lugar, alguns dos autores não são, de modo algum, as pessoas mais qualificadas do país nas suas áreas e estas não foram chamadas a dar o seu contributo crítico sobre o seu trabalho; em segundo lugar, alguns dos autores claramente excederam os limites das suas competências específicas, trabalhando sobre questões de que pouco ou nada entendem; finalmente, por mais elevada que pudesse ser a qualidade do trabalho realizado separadamente por oito entidades distintas (nuns casos, indivíduos, noutros grupos), só por milagre a conjugação dessas peças autónomas no todo da TLEBS poderia ter resultado em algo de coeso e consistente, quando nem uma única vez essas diferentes entidades trabalharam em conjunto para articular a nova terminologia para o ensino do português. Eu sei que é inacreditável esta última afirmação, mas oiça-se o cândido depoimento de uma das autoras, que se pode encontrar no sítio oficial da TLEBS, na secção de “perguntas mais frequentes”: “Na TLEBS há duas definições para Adjectivo, como para Advérbio, Nome e Verbo. Esta duplicação resulta de cada domínio ter sido tratado por um diferente autor e nunca ter sido feito um cruzamento dos dados.” Lê-se e não se acredita. Como é possível que, em tais condições, tenha sido assumida a responsabilidade de fazer chegar a Terminologia ao Diário da República e que ela esteja hoje a ser imposta ao país inteiro? Alguém terá de responder por tamanho absurdo.

(...)
A concluir as minhas notas críticas e avaliativas, lamento dizer que os comentários que aqui expendi (com a ironia que, para mim, quadra bem com tudo o que é tragicómico) mais não representam do que – acentuo bem – uma pálida amostra do muito mais que há para dizer de negativo acerca da TLEBS, nuns casos por manifesta insuficiência ou incorrecção da informação dada, noutros por uma estreita visão do objectivo a atingir, a que faltou um rasgo de coragem para as inovações e as rupturas fundamentadas que se impunham. Apesar disso, eu quero muito não perder mais tempo com a TLEBS, ou, dito de outro modo, não quero gastar mais cera com tão ruim defunto. Só o farei se a isso me sentir obrigado (sans rancune, pois estará a rodear as reais questões quem pensar em conflitos pessoais).
(...)
Quero de novo acentuar que fiquei com a impressão geral de que a TLEBS tem partes que, após revisão cuidada, são de acolher. Tenho pena de que não sejam todas, porque preferiria poder escrever um texto de elogio ao trabalho dos meus colegas, que passaria a usar e a difundir com muito gosto. Porém, perante o que me foi dado observar, não tenho dúvidas em declarar publicamente, com plena convicção e sentido da responsabilidade que assumo, que, independentemente das partes válidas que a TLEBS contém, o conjunto que abrange a Morfologia, as Classes de Palavras, a Sintaxe, a Semântica Lexical e a Semântica Frásica – que constitui precisamente o cerne do sistema linguístico – apresenta deficiências e lacunas de uma gravidade tal que fazem desta terminologia, tomada na sua globalidade, um objecto que não merece crédito científico, que envergonha a Linguística portuguesa e o próprio país e que não se entende como pode estar a ser introduzido no sistema de ensino. Se alguém tivesse como objectivo contribuir para tornar o ensino do português algo de odioso para os alunos, não poderia ter dado melhor ajuda.

(...)
Texto de 30 páginas, onde o autor faz uma análise do discurso hermético da TLEBS, das falhas e incoerências várias que apresenta e comenta as vozes que a têm defendido e atacado. Sem 'partidarices'.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

Ainda...


GramáTICa


Análise Sintáctica
por
Filomena Viegas - quarta-feira, 29 Novembro 2006, 01:02

Q:Na frase "Dormi miseravelmente esta noite.", qual a função sintáctica, à luz da nova terminologia, atribuída a "esta noite"?
Carla Pereira Profesora Braga

R:Na frase que apresenta ocorre o verbo intransitivo “dormir”, cuja grelha temática não apresenta argumento interno na predicação. Em “Dormi miseravelmente esta noite.”, o constituinte sublinhado tem a função de modificador do grupo verbal. Esta função sintáctica é desempenhada por constituintes não seleccionados pelo núcleo do grupo sintáctico que modificam. Podemos considerar “esta noite” como modificador preposicional, substituível por “durante esta noite”. Passa-se o mesmo em relação a frases do tipo “Domingo dormirei bem.”, onde “domingo” é igualmente substituível por “no domingo”.

Re: Análise Sintáctica
por
Virgílio Dias - segunda-feira, 4 Dezembro 2006, 08:40


Concordo inteiramente com a análise da Filomena. À luz da TLEBS - e é essa que, agora, nos ilumina - perfeita!
Mas...será que esta noite modifica, realmente, o predicado dormi miseravelmente, ou, antes, lhe acrescenta informação?
Devo confessar que seria para mim muito mais correcta uma descrição que respeitasse a verdade da frase e classificasse esta noite como complemento à informação dada pelo predicado: um complemento não argumental que se chamasse circunstancial, ou suplemento...mas que não fosse, apenas, modificador. Neste caso, modificador fica aquem da necessidade descritiva. Ninguém me convence de que esta noite, nesta frase, modifica seja o que for.
Continuo a pensar que não podemos abdicar do recurso aos complementos circunstanciais. Que inconveniente é que terão visto no seu uso? Teremos que os distinguir dos complementos preposicionados, teremos de diferenciar complementos argumentais de circunstanciais...façamo-lo. Mas é um erro querer eliminar esta ferramenta da descrição gramatical.



Re: Análise Sintáctica
por
Assunção Caldeira Cabral - quarta-feira, 29 Novembro 2006, 12:17

Bom dia, Virgílio, deixe-me meter a minha colherada: a análise da Filomena, «perfeita», não nos pode levar a concluir que "miseravelmente" tem um estatuto diferente de "esta noite". O que ela diz, e estou perfeitamente de acordo, é que o v. DORMIR, núcleo do predicado, não selecciona qualquer complemento e que, portanto, quer "miseravelmente", quer "esta noite" são modificadores do grupo verbal o qual, na frase em apreço, é constituído apenas pelo seu núcleo ("dormi"). Ambas as expressões têm o mesmo estatuto.Do ponto de vista da «sintaxe tlébica», o critério a aplicar em primeiro lugar é o da estrutura argumental do verbo porque é aí que se gera a gramaticalidade/agramaticalidade da frase. Os restantes constituintes são opcionais. Quando realizados sintacticamente alteram, naturalmente, o valor semântico da estrutura frásica, o qual pode/deve ser estudado à luz da semântica frásica (subdomínio B6). Daí o considerar-se que a função sintáctica desempenhada por qualquer dos constituintes não seleccionados pelo núcleo do grupo sintáctico é a de modificador. No documento TLEBS, na entrada MODIFICADOR, há uma chamada de atenção que esclarece as diferenças terminológicas: «Na tradição gramatical, os modificadores também se denominam adjuntos ou circunstantes.»Esta é a minha maneira de ver as coisas. Foi bom ter insistido na ideia dos complementos circunstanciais. Um abraço. Assunção



Re: Análise Sintáctica
por
Virgílio Dias - quinta-feira, 30 Novembro 2006, 09:43

Dormi miseravelmente esta noite
O predicado desta frase é dormi miseravelmente.
O verbo dormir poderá, eventualmente, ter usos de valor absoluto. Tentemos, no entanto, construir frases em que coloquemos aquele verbo como predicado, e veremos que, habitualmente, se trata de um verbo de dois lugares:
João dorme muito, pouco, bem, mal, na casa dos pais - ou: dorme tranquilo, agitado...
O constituinte esta noite, nesta frase, é, estrutural e funcionalmente, diferente do advérbio adjunto miseravelmente que, sintacticamente, é um modificador.
Há uma estratégia, a que recorro, em casos de dúvida: verificar se um constituinte é coordenável com um outro de que eu conheça claramente a função. Se o for, ele desempenham a função conhecida. Se o não for, estamos perante uma função diferente.
Nesta frase, miseravelmente e esta noite não são coordenáveis. Logo miseravelmente é um modificador; esta noite é outra coisa.
Mas, se formos tão TLEBISTAS que nos sintamos forçados a uma interpretação dentro dos seus cânones, há uma possibilidade de não ofendermos gravemente a gramática: classificaríamos esta noite como modificador de frase - e, como tal, já não integraria o predicado - como me parece desde a primeira leitura.


Re: Análise Sintáctica
por
Assunção Caldeira Cabral - quinta-feira, 30 Novembro 2006, 15:29

Não posso de maneira nenhuma concordar com a análise que defende mas, como não estou a ser capaz de me fazer entender, sugiro-lhe uma consulta detalhada da Gramática de M.H.Mateus...:
1. Para a determinação do esquema relacional do v. DORMIR: p.300;
2. Para a análise da estrutura interna do grupo verbal: p.409 (11.5.2.);
3. Para o estudo dos adjuntos: p.414 (11.5.3.). Na p.417 há uma síntese desta questão que me parece bastante esclarecedora, nomeadamente em relação aos circunstanciais;
4. Para a apresentação dos advérbios de modo: p.422;
5. Para a distinção entre o estatuto argumental/não argumental dos advérbios: p.425.
Por agora, penso que a leitura destes 5 pontos o deixarão mais esclarecido evitando, assim, perdermos tempo com divagações de um lado e do outro. Se não for o caso, sempre ao dispor.
Assunção
(...)
Re: Análise Sintáctica
por Virgílio Dias - segunda-feira, 4 Dezembro 2006, 08:40
Não imagina a Assunção a graça que eu encontrei no seu conselho: estude! É que muitos amigos, desde pequeno, têm tentado limitar o meu gosto pelo estudo. O meu Prefeito, nos Jesuítas (com quem, durante 9 anos, aprendi gramática e latim), não permitia que eu faltasse aos recreios para estudar; o meu médico limita-me, agora, a 2 horas o estudo diário; também a minha mulher vai tentando desviar-me daquilo que eu mais gosto: estudar.
Por isso, achei imensa graça ao seu conselho: estude! Até que enfim, alguém reconhece a minha necessidade de estudar mais, e mais...porque cada vez tenho a certeza de saber menos. Fico-lhe agradecido.

Fui revisitar todos os pontos que a Assunção me indicou. Nenhum me desviou da minha interpretação: esta noite e miseravelmente são dois constituintes tão diferentes que não lhes pode ser atribuída a mesma classificação sintáctica.
Mas não me limitei a cumprir o seu conselho. Fui ainda reler Los complementos adverbiales temporales. La subordinación temporal do Prof.Luis Garcia Fernandez (Univ.Castilla-La-Mancha) na Gramática Descriptiva de la Lengua Española, pág. 3129 a 3202. E não deixei de voltar a estudar o que nos diz o Prof. Leonardo Gómez Torrego na sua Gramática Didáctica. E sabe o que lhe digo? Fiquei ainda mais convencido do que tenho afirmado: miseravelmente pertence ao predicado; esta noite é outra coisa. Mas não se admire! Já o Prof.Malaca Casteleiro, que foi meu orientador de Mestrado, dizia que eu, nas questões de análise gramatical, sou demasiado teimoso - mas ia acabando por me dar razão. Espero que o mesmo venha a acontecer agora.

Forum GramáTICa

adjectivos?
por Eva Pires - sábado, 18 Novembro 2006, 23:57

Olá...
Queria aproveitar este espaço para colocar a seguinte questão: a que classe de palavras pertencem as palavras destacadas a seguir?

Ele foi o segundo aluno a chegar. Tu foste o primeiro.

Obrigada
Eva




Cara colega
as palavras destacadas na sua questão pertencem à classe dos adjectivos, e à subclasse dos adjectivos numerais. Assim: um, dois, três... são quantificadores numerais, 1º, 2º ... são adjectivos.
Espero ter ajudado
Glória



Re: adjectivos?
por Eva
Olá novamente...
A minha dúvida era em relação à palavra primeiro, por não surgir acompanhada por nenhum nome...
Obrigada pela rápida resposta



Re: adjectivos?
por Filomena

Boa noite Eva,
Venho dar-lhe a minha opinião. Se em vez de Tu foste o primeiro a nossa 2.ª frase fosse Tu foste o último, diríamos que se tratava de nominalização do adjectivo último. Julgo que também neste caso do adjectivo numeral podemos considerar que houve elipse nominal de aluno, apresentando primeiro um comportamento nominal.
FV

sábado, 2 de dezembro de 2006

Tlebs ...

http://ciberduvidas.sapo.pt/controversias/311006.html

Aos defensores da dita, pergunto o seguinte:

  • Porquê dizer que nas frases 'O rapaz foi a Lisboa', 'O rapaz está em Lisboa' e 'O rapaz estuda em Lisboa' temos respectivamente um complemento preposicional, um predicativo do sujeito e um modificador preposicional?

Isto simplifica?
Não era mais simples dizer que nos três casos tínhamos UM complemento circunstancial de lugar?

Não há dúvida das vantagens de alguns aspectos da Semântica frásica ou da Pragmática, por permitirem uma reflexão sobre o 'texto'. O que não consigo entender é da necessidade de alterar conceitos que estão enraizados e que fazem todo o sentido.
Outro exemplo:
  • 'O primeiro homem foi Adão'. Se 'primeiro' é (agora) um adjectivo e se está colocado à esquerda do nome então é (de acordo com a semântica frásica) não restritivo. Não é restritivo? Claro que é! Porquê colocar os numerais ordinais como adjectivos?

sexta-feira, 24 de novembro de 2006

TLEBS (de novo)

A garantia foi dada ao DN por Ramos André, adjunto do gabinete da ministra da Educação. Segundo explicou, a decisão depende de um conjunto de factores, desde "os resultados obtidos pelos alunos abrangidos pela TLEBS, em comparação com os restantes", ao conteúdo de "um conjunto de pareceres solicitados a especialistas pelo ministério".
Este responsável adiantou ainda que, mesmo que a generalização venha a ser a opção seguida, esta só poderá ocorrer "quando os professores se sentirem preparados e seguros sobre esta opção". (o verbo está mesmo no futuro??)


As contradições de quem me tutela fazem-me duvidar da minha sanidade. Mas que ‘organização’ é esta que cada vez que se telefona a colocar questões sobre a aplicação da TLEBS a resposta difere de quem se aventura a responder?
Então AGORA ainda está em experimentação? O ano passado massacrei os alunos com ela porque me disseram que era para aplicar. Leia-se o que na altura escrevi: aqui, aqui, aqui, aqui ou aqui.
É ÓBVIO que tem de ser revista, corrigida, pensada ANTES de integrar as práticas. Só quem quer mostrar serviço pode fazer tanto disparate junto.
Os manuais não são desculpa. A larga maioria dos de 7º está cheia de 'erros' (se considerarmos a TLEBS...)
Poupem-me a tanta incongruência!
Valham-nos os cérebros com voz e quem os alertou!

quarta-feira, 22 de novembro de 2006

Está dito!


A autópsia do Tioneu
Vasco Graça Moura Escritor


Num site do Ministério da Educação (http/www.dgidc.minedu.pt/ TLEBS/CDMateriaisDidacticos/ trabalhos/90_Lusiadas _3C.ppt), pode encontrar-se a TLEBS [Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário] aplicada à análise de uma estrofe de Os Lusíadas (II, 12), destinada aos alunos do 9.º ano e qualificada como "corpo linguístico ambíguo". O facto de o ministério ter acolhido o trabalho feito numa escola básica na sua página da rede fala por si.
A estrofe é esta: Aqui os dous companheiros conduzidos / Onde com este engano Baco estava, / Põem em terra os giolhos, e os sentidos / Naquele Deus que o mundo governava. / Os cheiros excelentes, produzidos / Na Pancaia odorífera, queimava / O Tioneu, e assim por derradeiro / O falso Deus adora o verdadeiro.
Depara-se-nos logo o fac-símile de duas páginas do Canto II da edição de 1572, com o terrível azar de não figurar aí a estrofe em questão... São reproduzidas as n.ºs 63 a 68, não se percebe porquê.A análise tem coisas extraordinárias.
Alguns exemplos:
1. Afirma-se que "o nome próprio Deus nos surge em três posições ambíguas. A primeira é naquele Deus que..., "pressupondo a existência de outros, o que o torna comum e lhe retira o carácter de entidade única".
Acontece que o nome Deus surge apenas em duas posições. E se, na terceira, está implícito, não está como nome. Em vez dele está o pronome "o" [verdadeiro].
A expressão "naquele Deus" não o dessingulariza. Não pressupõe, antes exclui a existência de outros. Basta ler. É um mero expediente enfático e métrico.
Não há qualquer ambiguidade. Deus não é contraposto a outros deuses em termos equívocos. Quando muito, ambíguo seria o verbo no imperfeito do indicativo ("governava", em vez de "governa"), por razões de rima, e isto é que devia ser explicado...
Diz-se também que a segunda e terceira posições da dita ambiguidade do nome próprio Deus estariam em "falso Deus" e "verdadeiro [Deus]".
Volta a não haver ambiguidade: um é falso e o outro é verdadeiro... Aliás, se ambiguidade houvesse, haveria que explicar, em termos empsonianos, que a incerteza ou sobreposição de sentidos funcionaria como recurso de intensificação do efeito poético e da ironia.
2. Pancaia é o nome de uma ilha utópica no Oceano Índico, imaginada por Evémero de Messina (séc. III a. C.). Havia nela árvores de incenso e outras essências vegetais próprias para rituais religiosos. Daí, "os cheiros excelentes, produzidos na Pancaia odorífera" e queimados por Baco. Mas lemos: "o nome próprio Pancaia assume também valor de nome comum devido à presença do determinante demonstrativo '...aquela', constituindo assim uma perífrase de 'Ilha'".
Isto continua a ser puro dislate. Mas o mais bizarro é que o tal determinante demonstrativo "aquela" com tão mágicas e sofisticadas propriedades, NÃO SE ENCONTRA na estrofe analisada!!! É forjado para fins da análise e isto é verdadeiramente grave... E mais grave ainda é o ministério avalizar esta enormidade!
3. Mas há outras coisas pungentes. Noções reaccionárias como sujeito, predicado, complemento directo, complementos circunstanciais, dão lugar a embrulhadas rebarbativas que, do ponto de vista da aprendizagem dos jovens, não adiantam absolutamente nada.
Basta ver como os complementos "...em terra" e "... os giolhos" são descritos. Para o primeiro, temos: "núcleo de um complemento preposicional em posição pós-verbal, constituindo uma unidade sintáctica que serve de locativo à forma verbal põem" e, para o segundo: "núcleo de um grupo nominal que constitui o complemento directo da expressão predicativa anterior". Por sua vez, "... e os sentidos naquele Deus que..." é explicado como "núcleo de um grupo nominal equivalente ao anterior, regido pela conjunção copulativa e que o transforma em complemento directo da expressão predicativa formada pela forma verbal põem".
4. "... produzidos na Pancaia odorífera..." é apresentado como "núcleo de um complemento preposicional seleccionado pela forma verbal 'produzidos' como argumento indispensável". O que é que um aluno vai compreender quanto ao argumento indispensável? De resto, pôr os joelhos em terra e produzir na Pancaia é assim tão diferente? Na Pancaia já não serve de locativo à forma verbal produzidos?
5. "... os cheiros excelentes" acarretam o odor evanescente de um "núcleo de um grupo nominal com função de complemento directo e um Modificador adjectival, em posição de atributo"...
6. "... com este engano Baco estava..." explica-se como "verbo copulativo aqui a assumir um valor absoluto ao dispensar o nome predicativo do sujeito - predicado de uma unidade de hierarquização também secundária". Como é que os alunos vão entender que, muito simplesmente, aquele "Baco estava" quer dizer "Baco encontrava-se ali"?
7. "... e assim por derradeiro, o falso Deus adora o verdadeiro" dá lugar a esta trapalhada: "Predicado da frase que constitui uma oração coordenada copulativa/conclusiva (ligada à anterior pela locução conjuncional e e o conector de valor conclusivo assim)". Parece que toda a frase é o "predicado da frase"…E o que será pegar em todos os dicionários e onde, na entrada "assim", vem indicado advérbio, alterá-los para se incluir "conector de valor conclusivo"?
8. "Por derradeiro" implica a seguinte explicação deveras transparente: "complemento preposicional aparentemente modificador do sujeito 'falso Deus' no que constituiria uma oração subordinada causal. Na verdade, no contexto, a expressão indica 'Por fim; finalmente' e reforça o valor conclusivo dos elementos anteriores". Quer dizer: formula-se uma hipótese desnecessária, antes de se dar a informação correcta...
Disto se vê como até os professores se enredam nas suas próprias confusões. Escapa à minha obtusidade como é que miúdos de 14 ou 15 anos, ainda por cima mal preparados, vão perceber tudo isto e muito mais nos 45 minutos que são expressamente indicados para a análise em questão. Não lhes chegará todo um ano lectivo à roda desta oitava camoniana!
Com a TLEBS, descobriu-se a maneira de reduzir o estudo de Os Lusíadas no 9.º ano a uma só estrofe das 1102 do poema. Coitado do Tioneu!
O ódio à Literatura atinge o seu paroxismo nestes modelos de autópsia.
Acuso deste crime o Ministério de Educação.

In DN de 22.11.

Tempo?

A resposta para os problemas da educação passa pelo tempo na escola?

Ver em http://www.oecd.org/dataoecd/6/47/37344903.xls




  • Tempo na escola dos alunos dos 7 aos 14 anos em 2004:
    Portugal - 19º lugar em 28 (eram, em 2004, dos que mais tempo passavam na escola)


  • Países onde os alunos aí estão menos tempo:

Finlândia e Coreia (melhores 'colocados' no PISA 2003)


Coincidências?


Será por isso que surgiu agora a ideia da 'Escola a Tempo Inteiro'? Por passarem na escola mais tempo, vão aprender mais ou melhor?
Há uns dias recebi um mail. Transcrevo:
Há dias a sobrinha de uma colega nossa aluna do 1º ano com 6 anos de idade ao fim de uma semana de aulas , AEC, AE, etc etc.... vira-se para a mãe e pede-lhe:
" Mãe arranja-me por favor um emprego que eu estou farta da escola , não tenho tempo para nada "...
Gostei de ler isto (especialmente o último quadro - afinal os professores de Matemática são excelentes, se se considerar o nível educacional dos pais dos alunos)

segunda-feira, 20 de novembro de 2006

ECD ...


Disse-se... mas não se disse. Eu digo!
Santana Castilho

A semana que passou, marcada pela vigília dos professores, pela entrega na 5 de Outubro de um documento com 65.000 assinaturas, de repúdio pelas propostas do Ministério da Educação, e pela greve dos estudantes, não foi, tão-só, "mais uma jornada de luta", que se somou à manifestação e à greve precedentes. A semana que passou patenteou, sobretudo, que o descontentamento e a agitação social se apossaram das escolas e começam a ser insustentáveis, face ao prejuízo imenso que repercutem no ensino e na educação dos alunos.
O país tem hoje dois problemas de monta. Um é substancial e de natureza económica e financeira: na educação, na saúde, na segurança social, na reforma do Estado, tudo se reduz a cortar, subtrair, nivelar por baixo. O outro é existencialista e de natureza patológica: na mente de alguns aninhou-se a missão de salvar a Pátria, albergou-se a verdade única e a convicção de que, em nome da "esquerda moderna", vale tudo.
Os que, como eu, pensam que a solução da crise económica é incompatível com uma política fundamentalista de anulação, em anos, de um défice que se engordou em décadas, admitem, com tolerância, que as regras europeias (com que não concordam) e a competitividade feroz do mercado global (que não apreciam) imponham modificações dolorosas para sanear as contas públicas. Mas não admitem que a factura seja paga apenas pelo trabalho e isente o capital; que as modificações sejam impostas e não negociadas; que a manipulação sem pudor dos números seja usada para fomentar a inveja e o ódio contra classes profissionais honestas; que a débil informação da generalidade dos portugueses seja demagogicamente aproveitada para lhes "comer as migas na cabeça". O que se segue fundamenta o que acabo de escrever. Os visados que desmintam, se forem capazes.
1. Nos últimos tempos disse-se, citando a OCDE e para os denegrir, que os professores portugueses eram dos mais bem pagos da Europa. O que permitiu a notícia, glosada até à náusea, foi um gráfico que se refere apenas aos professores do secundário com 15 anos de serviço, em função do PIB por habitante, que é dos mais baixos da Europa. Na mesma página, logo por cima do gráfico utilizado, está outro, bem mais relevante, que ordena os professores em função do valor absoluto do salário. E nesse, num total de 31 países estudados, os professores portugueses ocupam a 20.ª posição! Mas, sobre isto, nada se disse!
2. Disse-se, aludindo ao mesmo estafado indicador, que somos dos que mais gastamos com a educação. Mas não se disse o que importa: que o dinheiro efectivo gasto por aluno nos atira para a 23.ª posição entre os 33 países examinados e que, mesmo em relação ao PIB, estamos, afinal, num miserável 19.º lugar.
3. Disse-se que a prioridade das prioridades era a qualificação dos portugueses, mas não se disse como se concilia isso com o corte de 4,2 por cento na educação básica e secundária e 8,2 por cento no ensino superior. Como tão-pouco se disse, do mesmo passo, que os subsídios pagos pelo Estado a alguns colégios privados cresceram exponencialmente, de 71 a 108 por cento, como se retira da matéria publicada no DR de 16 de Outubro!
4. Disse-se, ainda, alto e bom som, que os funcionários do Estado estavam mais bem pagos que os privados. Mas não se disse que um estudo encomendado pelo Ministério das Finanças a uma consultora internacional (é moda agora adjudicar a consultoras externas e pagar-lhes a peso de ouro aquilo que os técnicos dos serviços sabem fazer) concluiu, e por isso foi silenciado, que os funcionários públicos ganham, em média, muito menos do que ganhariam se fizessem o mesmo trabalho para um patrão privado. E estamos a falar de diferenças que são, diz o estudo, de 30, 50, 70 ou mais que 100 por cento, em desfavor do funcionalismo público. Isto não se disse! As cerca de 300 páginas deste estudo estão, prudentemente, silenciadas na gaveta de Teixeira dos Santos.
5. Igualmente silenciados, porque não convém que se diga, estão os dados do Eurostat que mostram a inutilidade das medidas da ministra da Educação para a área: o abandono escolar precoce passou dos 38,6 por cento do ano passado para os 40 por cento deste ano, enquanto diminuiu por toda a Europa.
6. José Sócrates disse no Parlamento, qual justiceiro-mor que não ataca só os que pouco podem, que determinaria a inspecção obrigatória das empresas que declarassem prejuízos superiores a um milhão de euros, relativos a operações de reestruturação societária. Mas não disse... que isso já está na lei vigente e não passa, pois, de mero fogacho. Na mesma altura, disse ainda ir propor legislação destinada a obrigar os bancos a explicarem que manobras de planeamento fiscal estão a preparar. Mas não disse... , mais uma vez, que não estava a descobrir a pólvora, porque a lei actual já permite obstar a manobras que se destinem à simples obtenção de vantagens fiscais, assim tenha coragem de a aplicar. E, mais importante, não disse o óbvio, isto é, quando vai fazer legislação sem buracos e quando cumprirá a reforma do sigilo bancário que, segundo prometeu, já devia estar feita.
Digo eu que estes expedientes cansam!

Público, 20-11.06

domingo, 19 de novembro de 2006

35 horas

Ao ler isto da Teresa e isto do Miguel, lembrei-me disto que o ano passado me lembrei de fazer.

Este ano, fiz um quadro em excel, onde aponto as horas não lectivas que faço em casa. Se me limitasse a cumprir as 35, nem testes nem textos dos alunos corrigia. Onde vou cortar? Em algum lado terá de ser... Começo a ficar irritada comigo própria por querer fazer tudo bem.
Ainda terei de conseguir fazer como um casal amigo: chega ao fim das 9 disponíveis e pufff... acabou-se. Sou burra ou quê? Também já sei que não vou progredir muito mais, porque de cargos que de nada adiantam estou é farta. Já estive num executivo, no tempo em que nada se ganhava mais... a não ser juízo. E o que realmente me interessa é o que se faz no espaço da aula... o resto é fogo de vista e papelada para a qual não tenho apetência... 'Portantos', 'a modos que' tenho de me adaptar a esta nova profissão/posição. Melhores dias virão, com toda a certeza. Os regimes autoritários nunca duram, a realidade acaba sempre por provar a verdade.

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

ECD e TLEBS

Nova proposta de ECD.

Ao primeiro concurso de titular já só podem concorrer os do 10º.
Os do 8º e 9º já só concorrem se ainda houver lugares...

As horas da noite voltaram a ser contadas pelo factor que eram.

Já posso acompanhar as minhas filhas (mais de 10 anos).


Agora, graças à Pragmática Linguística da TLEBS, posso detectar um erro de coesão nesta «anáfora» que não tem antecedente. A expressão «nas quais» surge incoerente, pois não existe referente para ela... Ou seja, a cadeia de referência não existe.

Também, agora, posso apontar um erro de acentuação, que transforma um adjectivo num verbo, retirando ao texto a necessária coesão.

quarta-feira, 15 de novembro de 2006

Exames

Afinal, eu e os meus alunos teremos um ano descansado... «Tronco comum» exclui Camões, Saramago, currículo, TLEBS, texto dissertativo longo?

Será?

http://www.min-edu.pt/np3/131.html

terça-feira, 14 de novembro de 2006

sexta-feira, 10 de novembro de 2006

Autoridade

Crise de autoridade familiar na origem do aumento da violência escolar
in «Público» 10/11/2006


Especialistas em educação defenderam hoje que o aumento da violência escolar se deve, em parte, a uma crise de autoridade familiar, onde os pais renunciam a impor disciplina aos filhos, remetendo-a para os professores.
Vários especialistas internacionais estão reunidos na cidade espanhola de Valência a analisar até amanhã o assunto "Família e Escola: um espaço de convivência".
Os participantes no encontro, dedicado a analisar a importância da família como agente educativo, consideram que é necessário evitar que todo o peso da autoridade sobre os menores recaia nas escolas, o que obriga a "um esforço conjunto da sociedade".
"As crianças não encontram em casa a figura de autoridade", um elemento fundamental para o seu crescimento, disse na conferência inaugural do congresso o filósofo Fernando Savater." As famílias não são o que eram antes, um núcleo muito amplo e hoje o único que muitas crianças contactam é a televisão, que está sempre em casa", sublinhou.
Para Savater os pais continuam a "não querer assumir qualquer autoridade", preferindo que o pouco tempo que passam com os filhos "seja alegre" e sem conflitos e empurrando o papel de disciplinador quase exclusivamente para os professores.
No entanto, e quando os professores tentam exercer esse papel disciplinador, "são os próprios pais e mães que não exerceram essa autoridade sobre os filhos que intentam exercê-la sobre os professores, confrontando-os".
"O abandono da sua responsabilidade retira aos pais a possibilidade de protestar e exigir depois. Quem não começa por tentar defender a harmonia no seu ambiente, não tem razão para depois se ir queixar", sublinha.
Savater acusa igualmente as famílias de pensarem que "ao pagar uma escola " deixa de ser necessário impor responsabilidade, alertando para a situação de muitos professores que estão "psicologicamente esgotados" pela situação e se convertem "em autênticas vítimas nas mãos dos alunos".
Os professores, afirma, não podem ser deixados sós, e a liberdade "exige uma componente de disciplina" que obriga a que os docentes não estejam desamparados e sem apoio, nomeadamente das famílias e da sociedade."
A boa educação é cara, mas a má educação é muito mais cara", afirma, recomendando aos pais que transmitam aos seus filhos a importância da escola e a importância que é receber uma educação, "uma oportunidade e um privilégio".
"Em algum momento das suas vidas, as crianças vão encontrar disciplina" , disse. Em conversa com jornalistas, Savater explicou que é essencial perceber que as crianças hoje não são mais violentas ou mais indisciplinadas que antes, mas que hoje "têm menos respeito pela autoridade dos mais velhos". "Deixaram de ver os adultos como fontes de experiência e de ensinamento para os passarem a ver como uma fonte de incómodo. Isso leva-os à rebeldia", afirmou. Daí que mais do que reformas aos códigos legislativos ou às normas em vigor, é essencial envolver toda a sociedade, admitindo que "mais vale dar uma palmada, no momento certo" do que permitir as situações que depois se criam. Como alternativa à palmada, oferece outras, como suprimir privilégios, alargar os deveres ou trabalhos de casa.

domingo, 29 de outubro de 2006

...

NOTA À COMUNICAÇÃO SOCIAL
M.E. TENTA LANÇAR A CONFUSÃO PARA ENGANAR OS PROFESSORES E A OPINIÃO PÚBLICA
O Ministério da Educação procura, através de comunicado hoje divulgado, enganar a opinião pública e os professores, sobre sua intenção, explícita, de acabar com as interrupções da actividade docente, previstas no Artigo 91º do Estatuto da Carreira Docente (ECD). E como o faz?! Afirmando que irá manter as interrupções de actividade lectiva. Só que a questão não é essa, mas sim a intenção ministerial de eliminar as interrupções da actividade docente! Parece ser a mesma coisa, mas não é!
As interrupções de actividade lectiva são os períodos em que, no Natal, Páscoa e Carnaval os alunos não têm aulas. As interrupções de actividade docente são os períodos em que, naquelas pausas lectivas, terminadas as avaliações e outras reuniões que se realizam, os docentes ficam dispensados de comparecer nas escolas. No entanto, mesmo nessas interrupções de actividade docente, se necessário, os professores podem ser convocados. O actual ECD prevê essas interrupções, bem como as formas de convocação nesses períodos (Artigos 91º, 92º e 93º, que o ME pretende revogar).
No comunicado de hoje, do Ministério da Educação, a inverdade transforma-se em mentira quando é referido que, no projecto da Tutela, se apresenta uma proposta sobre a matéria e se indica o seu alegado texto.
Só que a mentira desmonta-se facilmente e, para isso, basta consultar a última versão do projecto do ME, datada de 25 de Outubro e que esteve em discussão, durante sete horas, na reunião de dia 27 (pode ser consultada nos sites dos Sindicatos). Na verdade, o artigo 91º é revogado, como se constata na página 58 do documento (artigo 18º - “Norma Revogatória”), e se confirma nas páginas 38 e 39, pois do artigo 87º o ME passa para o 94º.
Aliás, se não houvesse a intenção de revogar o artigo 91º que sentido teria a longa e dura discussão que, sobre o assunto, teve lugar na reunião “negocial” de ontem, dia 27?
É lamentável e pouco séria esta postura do Ministério da Educação! Este tipo de comportamento só pode merecer das organizações sindicais e dos professores e educadores um veemente repúdio.
Coimbra, 28 de Outubro de 2006
A Plataforma de Sindicatos
Nova greve a 9 e 10 de Novembro:
Lá vou eu, de novo, ajudar o governo com o problema do deficit...

Tá bem, tá!


Prestigiar os professores
Jorge Pedreira
Secretário de Estado adjunto e da Educação


O Ministério da Educação assumiu a alteração do Estatuto da Carreira Docente (ECD) como um imperativo político, por boas razões. O ECD deve ser um instrumento para a organização das escolas e a valorização do trabalho dos professores, tendo em vista a promoção do sucesso dos alunos, a prevenção do abandono escolar e a melhoria da qualidade das aprendizagens.
O ECD em vigor, tal como foi aplicado, contribuiu objectivamente para a degradação da função e da imagem social dos professores. Instalou-se a indiferenciação entre os melhores e os piores profissionais. Permitiu-se que professores com mais experiência e mais formação, usufruindo das remunerações mais elevadas, abdiquem de exercer responsabilidades especiais na escola, deixando com frequência aos seus colegas mais jovens as tarefas de coordenação e de supervisão pedagógicas. O ECD não contém quaisquer incentivos à melhoria das práticas pedagógicas. Só o brio e a consciência profissional de muitos professores permitem, apesar disso, notáveis exemplos de boas práticas e de inovação, de dedicação à escola e aos alunos.
Contudo, o êxito da escola não pode estar dependente apenas do brio e da consciência profissional. O trabalho dos professores não pode ser atomizado e é impossível organizar a escola com base na indiferenciação. É indispensável promover a cooperação e reforçar as funções de coordenação, dotando as escolas de um corpo de docentes reconhecidos, com mais experiência, mais autoridade e mais formação, que assegurem em permanência funções de mais responsabilidade. Nas outras profissões mais qualificadas, a norma é a diferenciação, expressa em categorias funcionais, às quais estão geralmente associadas dotações específicas nos quadros. O Ministério da Educação propõe a mais generosa das modalidades de estruturação. Propõe apenas duas categorias e que haja um coordenador por cada dois coordenados. É também indispensável determinar condições mais exigentes para o ingresso na carreira e para uma avaliação do desempenho que promova e premeie o mérito e que valorize a actividade lectiva. Atendendo às regras gerais de toda a administração pública, para garantir a diferenciação não é possível prescindir de quotas para as classificações superiores, que devem ser entendidas como a definição de graus de exigência relativos.
Desde a primeira hora, as associações sindicais dos professores rejeitaram liminarmente estas propostas e apesar de terem procurado fazer crer que aceitavam as regras de uma avaliação diferenciadora, continuam afinal a rejeitá-las. Reconhecemos que as propostas que apresentámos exigem dos professores uma adaptação profunda. Compreendemos que alguns professores se sintam inseguros ou até apreensivos com estas alterações. Entendemos, porém, que elas são razoáveis e absolutamente necessárias. Em nome do interesse público e do futuro da qualificação dos portugueses, não podemos renunciar a introduzi-las. Sem sacrificar aqueles princípios, durante o processo negocial, o Ministério da Educação apresentou alterações muito relevantes à sua proposta inicial, no sentido de corresponder a preocupações manifestadas pelos sindicatos. Apesar do esforço, não foi possível superar divergências fundamentais. Não poderíamos deixar-nos paralisar por isso.
Porque queremos continuar a trabalhar com os professores para produzir instrumentos de concretização do ECD, avançámos novas respostas para resolver problemas antigos - como a extinção dos Quadros de Zona Pedagógica ou a situação dos docentes sem horário lectivo. Propusemos aos sindicatos que participem na elaboração da regulamentação que teremos de adoptar em qualquer caso.Com a finalidade expressa de criar o clima de serenidade imprescindível a essa colaboração, fizemos importantes concessões (por exemplo quanto à apreciação dos pais ou ao prolongamento da carreira na categoria de professor). Sem esse clima, porém, tais concessões perdem sentido, não sendo viável um trabalho em comum.
Não está em causa a negociação colectiva, um direito que o Ministério da Educação respeitará escrupulosamente. O que está em causa é que os sindicatos queiram contribuir para a solução de problemas que importam realmente aos professores. A porta continua aberta para essa contribuição. Se os sindicatos rejeitarem esta proposta, todos perderemos um pouco. Mas perderão mais, e principalmente, os professores.

DN, 29.10.06

Engano?

RETRATO DA SEMANA
ANTÓNIO BARRETO

Todos os dias nos chegam notícias de medidas inesperadas e intenções imprevisíveis do governo. De tudo um pouco e avulso: decisões fulgurantes, novos planos, reformas radicais, investimentos fabulosos, extinções e reorganizações de serviços. Já se percebeu que o governo montou uma agência ou rede capaz de manter o domínio da informação, aquilo que eles dizem a "agenda". Por culpa dessa mesma rede de propaganda ou graças ao contributo criativo dos jornalistas e das suas fontes, uma parte das notícias é errada, outra é só parcialmente verdade e outra é finalmente verdadeira. Desta última, ainda há a distinguir entre o que realmente se fará e o que é apenas desejo e poderá ser contrariado pela vida. Alguns grandes investimentos, por exemplo, eram verdade até chegarem aos jornais, mas deixaram de o ser poucas semanas depois. Aumentos de preços e tarifas também são exemplos desta espécie de verdades efémeras. O que não impede que a maior parte das escaramuças de Sócrates foram lançadas assim, repentinamente, num discurso. É esse o jeito deste especialista em emboscadas. A aspirina nos supermercados, o fim de algumas Scut, a redução das férias dos juízes e dos professores e o aumento de impostos dos deficientes das forças armadas são exemplos de "rumores" verdadeiros.
PODERÍAMOS REAGIR COMO TANTAS vezes apetece. Isto é, considerar apenas que "são todos uns incompetentes", incluindo nestes todos os gabinetes dos governantes e as redacções dos jornais. Seria também possível considerar, na mais velha tradição popular, que "eles" são todos mentirosos, sendo eles, uma vez mais, os políticos e os jornalistas. Mas as coisas são mais complicadas. Na verdade, suspeito que muitas destas notícias erráticas são deliberadamente fabricadas, seja pelos gabinetes do poder, seja pelos da oposição. Assim como pelos sindicatos e patrões. E também por jornalistas e "fontes" partidárias anónimas. As intenções destas mentiras, meias verdades, boatos, fugas de informação e notícias verdadeiras são várias. Em alguns casos, trata-se simplesmente de "ver se pega" e de "apalpar" as reacções. Noutros, são dissidentes dos partidos que querem assim tornar difícil a vida dos governantes ou das direcções partidárias. Por vezes, trata-se de inexperiência das organizações que dizem o que ainda não devem. Outras, são puras invenções de jornalistas que não fazem o trabalho de casa e não verificam as fontes e os boatos. Finalmente, também temos as tentativas de exagero sensacionalista, da autoria das mais diversas pessoas, jornalistas "empenhados", políticos na sombra, partidos, sindicatos e empresas, com o fim de "dramatizar" uma qualquer questão.
AS ÚLTIMAS SEMANAS FORAM FÉRTEIS neste género de notícias erráticas. Aumentos de impostos, de propinas e de tarifas de serviços públicos; número de abortos legais e clandestinos praticados em Portugal; ou redução das pensões e das comparticipações nos medicamentos foram exemplos. Ainda hoje não sabemos exactamente com que contar. Como os nossos políticos brincam alegremente com os números, é difícil ter uma ideia. Um ministro e um autarca, por exemplo, dizem exactamente o contrário, um do outro, diante de números supostamente iguais. De igual modo, um ministro, um patrão e um sindicalista referem "dados de facto" absolutamente opostos, mas relativos à mesma realidade. Quem necessita da informação para a sua vida profissional, ou simplesmente porque quer estar informado, pode abandonar qualquer esperança de conhecer os factos a tempo.
VEM ISTO A PROPÓSITO DE DUAS informações, ainda não confirmadas, recebidas nestas últimas semanas. Primeira: o ensino da filosofia no secundário vai ser considerado marginal, isto é, optativo, e o respectivo exame de 12º ano deixa de ser obrigatório, incluindo para os alunos que, na universidade, pretendam cursar ciências sociais, direito, história ou mesmo filosofia. Conclusão inevitável: nunca mais alguém se vai interessar pela filosofia e o seu ensino está condenado a curto prazo. Segunda: a ministra da Educação pretende que já no próximo ano os professores sejam obrigados a dar oito horas de aulas por dia. Eis duas notícias dadas pelos jornais que me deixaram perplexo. A ponto de não acreditar. São de uma tal ignorância e de tal modo insensatas que não podem ser verdade. Devem fazer parte das provocações dirigidas contra alguém, neste caso contra a ministra e o seu ministério.
NÃO QUERO ACREDITAR, MAS A verdade é que a morte da filosofia na escola tem fortes possibilidades de ser verdadeira. Nunca vi desmentido. Até já li artigos assinados por Nuno Crato e José Gil justamente indignados. Não consigo perceber o que leva o ministério a cometer um crime destes. Numa altura em que está na moda o "conhecimento transversal" e em que os manuais elogiam a "interdisciplinaridade" e a "multidisciplinaridade", a extinção da filosofia tem o odor da poupança e da facilidade. Ou então vem daqueles círculos que querem uma escola virada para o emprego, as técnicas, "a vida", dizem eles. A filosofia deve ser considerada inútil, difícil, traumatizante e eventualmente burguesa ou livresca. Também pode ser que a considerem perigosa, porque ajuda a pensar. Num tempo em que os conhecimentos explodem e se diversificam, nada mais essencial, nada mais útil do que uma disciplina que possa fazer sínteses, que ajude à formação de uma visão do mundo, que permita aprender como os homens pensam e que ajude a raciocinar. A filosofia é essa disciplina. É quando a escola se vira para as profissões e foge da cultura que mais se precisa da filosofia. Já o senhor marquês de Pombal dizia que era necessário "o estudo da filosofia e das artes, pois servem de base de todas as ciências"! Eu sei que a estupidez tem tradições e não deveria ficar surpreendido. Por razões semelhantes se foram retirando das escolas as artes plásticas, a história da ciência e da arte, o teatro e a música. A própria geografia foi atirada para uma antecâmara do lixo e não ficaria admirado que a história siga um dia o mesmo caminho. Mesmo assim, não quero acreditar na decisão do ministério. Deve haver engano.
COMO ENGANO DEVE HAVER NAS notícias que nos dizem que a ministra quer que os professores cumpram oito horas de aulas por dia. Oito vezes cinco dias, temos quarenta horas de aulas por semana. A que se devem acrescentar as horas de reunião de turma e de escola, as horas de recepção dos alunos e dos pais, as horas de revisão de testes e de exames, as horas de substituição de professores e as horas de acompanhamento de estudo e trabalho, sem esquecer evidentemente as horas de preparação de aulas. Pensar que isto é possível ou que deve ser feito releva de uma mente definitivamente descolada da realidade. Desafio qualquer ser humano a cumprir este horário! Creio que nem sequer vale a pena fazer mais contas e argumentar. Não quero acreditar. Deve ser engano.

(In Público de 29 de Outubro de 2006)

quinta-feira, 26 de outubro de 2006

Mentir é feio

Nota à Comunicação Social
PROCESSO DE REVISÃO DO ECD:
PRIMEIRO-MINISTRO ESTÁ A MENTIR!


Só por desconhecimento, distracção ou tentativa de enganar a opinião pública, o Primeiro-Ministro, José Sócrates, poderá ter afirmado que as organizações sindicais de docentes teriam, finalmente, concordado com a introdução de mecanismos de avaliação do desempenho na carreira docente e com a sua divisão em duas categorias.

Relativamente à avaliação do desempenho, os Sindicatos de Professores concordam com a sua existência há, pelo menos, 16 anos, ou seja, desde que foi aprovado o primeiro Estatuto da Carreira Docente. O que tem separado (e continua a separar!) os Sindicatos, do Ministério da Educação, é que, para as organizações sindicais, a avaliação do desempenho deverá ter um carácter essencialmente formativo, servindo para melhorar a qualidade do desempenho dos docentes. Já para o ME, os objectivos são outros: castigar os professores, retirar-lhes tempo de serviço que cumpriram, impedi-los de chegar ao topo da carreira e, em situação limite, expulsá-los da profissão. Daí que, também sobre esta matéria, as divergências entre os Sindicatos e o Ministério da Educação se mantenham!

A admissão, em sede de negociação e num esforço extraordinário de procura de consenso, de uma eventual aceitação do modelo (do modelo!) proposto pelo ME, dependeria sempre da sua disponibilidade para deixar cair os constrangimentos de carreira que propõe (quotas e vagas). O ME não aceitou o esforço sindical, logo essa flexibilidade negocial assumida pelos Sindicatos, deixou de existir!

Quanto às duas categorias, trata-se de outra questão fracturante no actual processo de revisão que, na reunião realizada ontem com o ME, ocupou a maior parte da discussão. Para os Sindicatos de Professores, a existência de duas categorias significaria a negação da própria profissão, pois deixaria a meio da carreira milhares de professores e educadores que são dos melhores que existem nas escolas!

Já a admissão (admissão!) de introduzir no debate a existência de um ou dois patamares salariais (que não se confundem com categorias!) de acesso condicionado, para os Sindicatos dependeria de um compromisso a assumir pelo ME: nenhum professor ou educador actualmente no sistema poderia ser impedido de atingir o actual topo da carreira (10º escalão – índice salarial 340), pelo que tais escalões, a existirem, teriam sempre de ser superiores ao actual topo. Este compromisso exigido pelos Sindicatos foi desde logo recusado pelo ME, pelo que tal discussão terminou no momento em que se colocou!

Assim sendo, o desacordo global manifestado pelas 14 organizações sindicais de docentes que constituem a Plataforma Sindical de Professores mantém-se em absoluto e a FENPROF exige que o Primeiro-Ministro, José Sócrates, corrija as suas afirmações, pois fica mal a um governante com as responsabilidades de Primeiro-Ministro, de fazer afirmações que não são verdadeiras!

Por fim, a FENPROF apela aos professores e educadores para que se mantenham atentos, pois, como se prova, o Governo, neste momento, não olha a meios para atingir os seus fins que parecem ser a criação de confusão e de divisões entre os professores. A consulta dos sites dos Sindicatos da FENPROF será sempre o meio de informação mais adequado sobre o ponto da situação negocial.


O Secretariado Nacional

quinta-feira, 19 de outubro de 2006

Chantagem

A posição do ME é definitiva. Está concluída. Os sindicatos...ou querem parar de tentar afundar o barco... ou querem entrar no barco connosco.

Maus pais

Um pdf que recebi por mail sobre os maus pais.

quarta-feira, 18 de outubro de 2006

A não perder...

No Eduquês, mais uma carta aberta de Santana Castilho.

Ignorância

Hoje tive a infelicidade de ouvir os comentários de Miguel Sousa Tavares à greve.
Uma das coisas que venho ensinando aos meus alunos e às minhas filhas é de que não se devem fazer juízos de valor nem comentários acerca de pessoas ou acontecimentos, sem haver um conhecimento real dos factos sobre os quais se opina. Quando tal acontece – explico-lhes eu – para quem está dentro do assunto revela-se ignorância, leviandade e arrogância.
É um facto que este senhor, a quem eu sempre ouvi com interesse quando comentava assuntos que eu desconhecia, revelou ser ignorante, leviano e arrogante. Vejamos: então no actual estatuto os professores com mais de quarenta anos deixam de dar aulas? Afirmou-o. Não está prevista qualquer avaliação? Verifique-se aqui. Ou aqui, como muito bem revela Paulo Guinote.
Pois é. Agora já sei que muitas vezes falará sem saber do que fala. Já sei como o ouvir da próxima vez.

terça-feira, 17 de outubro de 2006

Tempo...

Com 43 anos, dos quais metade de um como correspondente comercial numa empresa (feito de imenso e diário tédio e consequente sensação de estupidificação crescente) e 18 no ensino, sempre com prazer, até ao ano lectivo de 2004/2005, chego hoje à conclusão que realmente escolhi mal. Entre o tédio e o facto de nem tempo ter para respirar, para poisar e reflectir sobre as coisas, não há dúvida: viva o tédio!
Isto a propósito das reduções: agora no novo ECD surgem apenas aos 50, até ao máximo de 6; no ainda em vigor, a partir dos 40 até ao máximo de 8; surgiam, quando entrei na carreira, ao fim de cada 5 anos de serviço. Estariam loucos? Ou estão agora?
Há uns poucos anos atrás, eu não sentia as limitações que hoje sinto. Nunca precisei de apontar nada e nunca me esquecia de nada. As caras dos alunos eram únicas no final de duas semanas, os seus nomes claros e sabia exactamente o que tinha dito a uma turma e faltado dizer na outra. Numa noite corrigia uma turma de testes sem nunca me faltar a concentração. Agora, as caras e respectivos nomes só são únicos ao fim de muiiiiito tempo. Agora, se não aponto o que tenho de fazer no dia seguinte, pareço andar com um detector de metais à procura de uma moeda no deserto. Agora, corrigir uma turma de testes é escalar o Everest.
Como eu entendo e sinto a necessidade das reduções! Duvido que aguente até aos 55 neste ritmo. Mas tenho de aguentar. Afinal, tudo se aguenta. Em que condições? Não interessa. Tenho de me convencer que sou um militar e apenas tenho de obedecer a generais! Tenho de me convencer que isto de dar aulas é uma brincadeira e que não é necessário fazer o melhor possível - basta fazer o que o tempo deixa. Como disse uma encarregada de educação numa reunião a que também fui no mesmo papel - os professores substitutos podem inventar qualquer coisita para dar nessas aulas. Embora tenha comentado que «aulas não se inventam», se calhar é o que tenho de começar a fazer para ter tempo de viver.

segunda-feira, 16 de outubro de 2006

Despesas/Poupanças


Despesa da Educação equivale a 3,7% do PIB
A despesa do Ministério da Educação contemplada na proposta de OE para 2007 é de 5,8 milhões de euros.

A despesa do Ministério da Educação contemplada na proposta de OE para 2007 é de 5,8 milhões de euros.
De acordo com o Governo este valor representa um corte de 4,2% face a 2206, correspondendo a 3,7% do PIB e a 10,7% das despesas da Administração Central.
Esta variação, de acordo como documento "resulta do efeito conjugado de um decréscimo nas despesas de funcionamento cobertas com receitas gerais com incidência relevante no ensino básico e secundário e nos investimentos do plano e de um acréscimo nas despesas com a educação pré-escolar. O decréscimo foi possível sobretudo pela introdução de medidas na organização e gestão dos recursos educativos".
Que rica gestão: sobrecarregar quem cá está e deixar no desemprego quem cá esteve anos e anos; congelar ad eternum a progressão de todos. É fácil, barato e dá milhões.
Amanhã e quarta vou dar mais uns trocos ao Ministério, para os ajudar a não enterrar definitivamente o sistema público de educação.

quinta-feira, 12 de outubro de 2006

Saúde

Acabei de ouvir Correia de Campos. Gostei particularmente da cara da entrevistadora quando este argumenta, depois da pergunta do peso económico em orçamentos mais baixos da nova taxa para internamentos:
- Sabe quanto custa um maço de cigarros? 3 euros e vinte!

Ainda bem que há tanta lucidez nos nossos governantes.

quarta-feira, 4 de outubro de 2006

Futurologia

Novas resoluções ministeriais apontam, na sequência dos bons resultados obtidos com o novo ECD dos professores, no que diz respeito a faltas, que a ideia nuclear dos 97% de presença no serviço se aplique a todos.


Assim, com mais de 3% de faltas, justificadas ou não, determina-se que:

  • os alunos ficarão retidos no ano em que estão;
  • os deputados não se poderão recandidatar;
  • todos os funcionários públicos ou por conta de outrem não poderão ser aumentados e/ou progredir na carreira.

Adenda: segundo a nova proposta que vi no Miguel Pinto, já deram com este disparate. Vá lá... agora já vai em 5% e as equiparadas à prestação efectiva de trabalho não contam.

Manifestações

sábado, 30 de setembro de 2006

Números...

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Não há nada com tanta aparência de eficácia e rigor como os números quando se pretende comprovar uma argumentação, um raciocínio sobre a realidade, uma política que se pretende ser a mais justa e correcta. Daí o constante recurso aos números e às estatísticas como armas de arremesso contra os docentes quando se trata de substanciar o que se querem fazer passar por evidências. Já vi a Ministra atirar gráficos para uma mesa durante uma entrevista, sem que ninguém os colocasse em causa ou sequer lhe pegasse, assim como desde o início que aqueles gráficos marotos no suplemento da Visão me deixaram algo perplexo perante aquilo que julgava saber sobre a evolução do nosso sistema educativo.
Manipulação voluntária ou falta de jeito para a construção de séries estatísticas, algo não batia certo quando olhava para aquelas linhas e as achava erradas.
Perante isso nada como ir às fontes da informação e então, encarando a coisa como um investimento paralelo ao meu actual trabalho em história da Educação, lá encomendei os dados oficiais do GIASE sobre as séries cronológicas para docentes e alunos relativos ao período de 1985-2005.
E o que se constata? Constata-se que alguém andou a fazer as somas erradas ou então que andou a usar incorrectamente os dados ou a “colar” séries de dados com origens ou critérios diferentes.
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Voltando ao suplemento oficioso do Ministério da Educação na Visão de 5ª feira e muito em particular ao press-release ministerial assinado por Paulo Chitas, houve desde o início um detalhe estatístico-visual que me deixou curioso.
Logo na p. 10 existe um gráfico de escala dupla onde se compara a evolução entre o número de docentes e alunos nos últimos 15 anos, apesar da diferença de nºs absolutos. Esta forma de apresentar os dados é atractiva pois, apesar da diferença nos números, permite comparar as respectivas evoluções. É claro que as duas escalas devem ser proporcionais para tudo correr bem e não se distorcer demasiado a leitura.
Em boa verdade o melhor método teria sido reduzir a índices os valores dando o valor 100 ao início ou à média da série e fazer um gráfico de escala única, mas este método também é admissível.
O meu problema foi quando reparei que as escalas não eram exactamente proporcionais...
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Doem-me os olhos. Já nem os óculos ajudam. Li este blog de fio a pavio. Obrigado pela dica, Amélia.

terça-feira, 26 de setembro de 2006

Curiosidades

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Podia ir para o ME o nosso engomadinho das Taipas :)

5 de Outubro

É feriado... Vou passear em Lisboa.